Comit
Estadual pela Verdade, Memria e
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da Verdade RN
Pgina
Inicial | Anatlia
de Souza Alves de Melo | Djalma
Maranho | dson
Neves Quaresma | Emmanuel
Bezerra dos Santos | Gerardo
Magela Fernandes Torres da Costa | Hiran
de Lima Pereira | Jos
Silton Pinheiro | Lgia
Maria Salgado Nbrega | Lus
Igncio Maranho Filho | Lus
Pinheiro | Virglio
Gomes da Silva | Zo
Lucas de Brito
VRGILIO GOMES DA SILVA 249f
At
tu,
companheiro?
Equipe
Clnico-Grupal Tortura Nunca Mais
O filme O que isso, companheiro?,
baseado no livro homnimo de Fernando Gabeira, consagra nas telas a
adaptao para os dias de hoje da verso militar para os anos de
chumbo.
Alegando tratar ficcionalmente o
episdio do seqestro do embaixador americano, sem pretenso de
reconstruir a histria do pas e com a anuncia do escritor, o filme
oferece o texto ideal ao arremate de mais um captulo da histria dos
modos de silenciamento utilizados pelos sucessivos governos ps 64 em
seu processo de apropriao de nossa memria.
Do terror que calava, a-se
praticamente sem escalas obrigao de esquecer. O que reclamaro
agora ex-presos polticos e familiares do mortos e desaparecidos? J
no tiveram a anistia, o reconhecimento da responsabilidade da Unio
nas mortes e a indenizao dos familiares? E, finalmente, a esquerda
tambm j no pode contar sua
prpria verso? Agora chaga. Deixemos o ado e cuidemos da
vida.
Esta tem sido a recomendao ouvida em
diferentes tons e verses a partir da dcada de setenta, desde que
grupos de familiares de mortos e desaparecidos se organizam para
denunciar as prises ilegais, torturas, assassinatos e ocultamento dos
corpos dos presos polticos perpetrados pela represso.
Segundo o discurso do poder poca, a
Segurana do pas estava sendo ameaada por elementos terrivelmente
perigosos, treinados e armados por Moscou para implantar o comunismo.
Era preciso, portanto, cortar o mal pela raiz e, cabia s Foras
Armadas o papel de identificar e aniquilar exemplarmente o inimigo. Para
esta gloriosa tarefa conclamavam o povo a denunciar qualquer suspeito. As
mortes, se ocorriam, eram entre foras em guerra ou por suicdio.
Quanto aos desaparecidos, estes
encontravam-se, na verdade, foragidos. Definitivamente, no havia tortura no Brasil.
Com o enfraquecimenmto do regime, os
militares concedem uma jogada de
mestre: a Lei de Anistia, que possibilita a volta do exlio e a
libertao de militantes presos, tambm se aplica aos torturadores,
igualando a todos no perdo. Familiares de mortos e desaparecidos que
exigem a localizao de seus parentes e a investigao dos
desaparecimentos am a ser ameaados e acusados de desestabilizar o
processo de redemocratizao do pas.
Recentemente, quando j no h como
negar as evidncias de torturas e mortes, alguns militares ilustram em
entrevistas publicadas no livro Os Anos de Chumbo A Memria
Militar Sobre a Represso a verso conhecida para o momento. Ora,
afirmam que no houve tortura no Brasil e que tudo no ou de
inveno da esquerda para justificar as delaes ou dos advogados
para argir a legitimidade dos inquritos. Ora, item que a tortura
existiu, mas de forma ocasional,
devido aos excessos de alguns desequilibrados. No mximo, justificam o
uso de algum nvel de presso
psicolgica ou fsica, , pois, afinal, estava em jogo a defesa da nao.
Finalmente, frente crescente fora
poltica das entidades de defesa do direitos humanos e a divulgao
pela imprensa de provas das mortes por tortura e execuo sumria,
preciso responder opinio pblica. Assim age o governo equilibrista
de F. H. C.: sanciona a lei que reconhece a responsabilidade da Unio
nas mortes de alguns militares e indeniza seus familiares, mas dobra-se
presso militar que impede as investigaes e a abertura dos
arquivos da represso. Alm disso, conclama a nao a esquecer o
ado e aponta o Estado e os grupos radicais de esquerda e direita
como os responsveis pelas mortes e desaparecimentos polticos. (JB
29/08/95)
O terror foi a estratgia
usada para garantir o
ambiente necessrio para
a consolidao de
governos e polticas
ditatoriais,
impopulares e injustas.
Esta perspectiva, que promove uma
intencional descontextualizao poltico-econmica no quadro que
produziu ditaduras militares em srie em todos os pases do cone sul
a que parece nortear o filme de Bruno Barreto, onde tudo parece girar
em torno de alguns jovens idealistas que pegaram em armas e provocaram
uma dura reao militar. Uns e outros so responsveis pelo que se
seguiu: O torturador em conflito justificando a necessidade de seu
novo ofcio esposa incrdula e o guerrilheiro Jonas
ameaando torturar o embaixador so apresentados como as duas
faces da mesma moeda. Como analisa Franklin Martins, em artigo no jornal
O Globo de 10/05/97: notvel o esforo para dissolver as
fronteiras entre os dois lados, mostrando-os como assemelhados. Com
isso, tenta-se afastar a necessidade de que o cineasta, atrs da
cmara, e o espectador, em frente da tela, tenham de se colocar diante
dos dilemas da poca. Se todos os gatos so pardos, e ningum est
errado, para que tomar posio? Em vez de reflexo, digesto. a
receita de uma poca: a atual. No era a dos tempos que o filme
pretendeu retratar.
Naqueles tempos, o mundo estava dividido
em dois grandes blocos: de um lado, o mundo capitalista cristo
representado pelos EUA e de outro, o perigo comunista ateu, identificado
com a URSS. Neste contexto, a ideologia de segurana nacional, jogava
um papel fundamental, justificando a represso a qualquer um que
questionasse a ordem vigente. Visava no somente a eliminao fsica
dos opositores ativos do regime os subversivos mas a
disseminao do medo, imobilizando e calando toda sociedade. Com os
canais polticos tradicionais obstrudos, alguns pegaram em armas.
No foram os nicos a conhecer o inferno da tortura. O terror no foi
um fato aleatrio, excesso ou excesso episdica, nem se deveu a
traos psicopatolgicos de uma dzia de torturadores, j nos
alertava Hlio Peregrino, em 1985. O terror foi a estratgia usada
para garantir o ambiente necessrio para a consolidao de governos e
polticas ditatoriais, impopulares e injustas. As ditaduras orientadas
por militares americanos, criaram uma espcie de laboratrio de
produo de dano irreversvel. Alm de informao ou confisses
visavam a quebra exemplar de toda e qualquer resistncia atual ou
futura dos presos. Seus filhos, pais e companheiras foram tambm
torturados ou lhes assistiram as torturas. Alguns, foram supliciados
at a morte, e tiveram seus corpos desaparecidos, estendendo a tortura
aos familiares e amigos que, em vo, tentavam localiz-los e por muito
tempo, negaram-se a realizar o processo de luto, como nica forma de
resistncia ao esquecimento imposto pelas autoridades.
Como medir as marcas, os efeitos que tais
violncias exercem at hoje? Como se exigir levianamente que se vire a
pgina, se essas histrias ainda no encontraram espao na histria
oficial? Um dos mais perversos efeitos desse silenciamento que o
dano, ao ser mantido em segredo e transformado em problema individual,
aprofunda o isolamento, vitimiza e faz funcionar um movimento de
despotencializao poltica.
Contribuir para isso, sob qualquer
pretexto e em qualquer medida, quando se tem o aos meios e
mdia, optar pela conivncia, quando se podia utiliz-los para o
esclarecimento.
A tortura no ato de guerra, crime
de guerra, crime contra a humanidade! A violao do direitos humanos
essenciais no atinge apenas as vtimas diretas, compromete toda a
sociedade. Mas, se a sociedade no se percebe como atingida por
desconhecer informaes ocultas at hoje e no reconhece o dano,
este continuar reduzido ao espao privado da vida familiar dos ditos
atingidos pela manto da impunidade, continuaro a fazer vtimas e a
comprometer a democracia.
*Equipe de profissionais responsveis
pelo
projeto de apoio mdico-psicolgico e de reabilitao fsica
e social para vtimas da tortura.
As duas Mortes do Companheiro Jonas
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