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Conta a Histria da Sua Vida
Nelson Patriota, 2010
18.
Vida e morte de dona Joaquina
Enquanto
eu escrevia o livro “...e l
fora se falava em liberdade”, cheguei
a elaborar mentalmente um projeto de fico
que nunca executei. Eu j tinha a
personagem, cuja data de “nascimento”
estava bem fresca em minha mente. Era uma
certa dona Joaquina, nascida numa excurso
que fiz Europa com Lourdinha, Paulo
Frassineti e sua Eliane das Virgens, Paulo
Lucas e sua Maria do Socorro Sena, e outras
pessoas do nosso ciclo de amizade.
A certa altura do eio, quando fazamos
o roteiro das ilhas gregas a bordo de um
navio, Paulinho Frassineti, descendo uma
escada do deck me interpelou: “Bira,
como vo as coisas?”. Respondi
de imediato: “Olha, Paulinho, como
dona Joaquina sempre diz, as coisas esto
indo em ordem”.
Curioso, ele quis saber quem era essa dona
Joaquina de quem eu falava. E a
fui inventando a personagem ali mesmo, juntando
traos de pessoas conhecidas, acrescentando
traos fsicos e psicolgicos.
Perspicaz, Paulinho percebeu o jogo e comeou
a dar sua contribuio para
a definio da criatura que,
agora, ganhava dois “pais”.
Combinamos ento em popularizar nossa
personagem, mas mantendo um qu de
segredo em torno dela, a fim de despertar
a curiosidade das pessoas. E assim aconteceu.
Dali a meses, dona Joaquina estava superpopular
entre nossos amigos e conhecidos e todo
o mundo comeou a indagar quem ela
era e a imaginar mil coisas a seu respeito.
Para afastar suspeitas domsticas,
tratei de explicar tudo a Lourdinha, que
riu bastante com a nossa astcia.
Quando eu e Lourdinha e alguns amigos viajamos
a Florianpolis, fomos visitar a
Praia de Joaquina. Era impossvel
que ningum se lembrasse de perguntar
pela “minha” Joaquina. Ali mesmo
desembuchei: “Dona Joaquim terminou
seus dias aqui, por isso a praia tem o seu
nome, em retribuio
irao que as pessoas tinham
por ela, uma pessoa bonssima, segundo
a opinio geral dos praianos”.
Aproveitando o embalo da fantasia, prossegui:
“Outros dados de sua biografia informam
que ela nasceu em Macaba, mudando-se
depois para Natal, onde foi amicssima
de Maria de Barros, a popular Maria Boa
do bordel do mesmo nome. Dona Joaquina teve
amantes dos mais diversos extratos sociais,
inclusive gente da poltica e do
comrcio”. Em seguida, acrescentei
que um dia, quando se esbaldava no bordel
de Maria Boa, ela conheceu o capito
de um navio mercante que se apaixonou loucamente
por ela, levando-a para a Europa e cumulando-a
de joias e uma farta conta bancria.
Mas um dia, ela cansou dessa relao,
e resolveu voltar para o Brasil, escolhendo
o litoral de Santa Catarina para morar.
Depois de uma pequena pausa, prossegui:
”Paira um grande mistrio acerca
das razes que levaram dona Joaquina
a deixar a vida de luxo e prazeres que levava
na Europa, para se refugiar solitria
num pequeno chal que mandou construir
especialmente para ela prpria na
praia que hoje leva o seu nome. H
verses que apostam que o objetivo
do seu recolhimento seria ageiro. Acabaria
logo que conclusse a escritura de
suas memrias. Mas o certo
que ela nunca mais voltou a Natal. Por que
razes, ningum at
hoje descobriu”.
Lembro que algum do grupo perguntou
se eu no teria uma verso
pessoal para o grande mistrio que
cerca os ltimos dias de Joaquina.
Respondi que sim, mas que por enquanto preferia
no contar. Talvez contasse num livro
que estou escrevendo mentalmente, mas que
em breve colocarei no papel.
Imaginar uma vida para dona Joaquina se
tornou um atempo interessante e agradvel
para mim. Acho que assim que os
escritores de fico fazem:
vo imaginando aos poucos a personagem,
at v-la completa e complexa,
com traos bem distintos. Nesse ponto,
quase cheguei a ser um escritor de fico.
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