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Insurreio Comunista de 1935 em Natal e Rio Grande do Norte 5n5w1g

Lauro Reginaldo da Rocha - Bangu

Bangu, Memria de um Militante
Braslia Carlos Ferreira – Organizadora, 1992

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III – Mos obra!

O alvar de soltura veio para ns, os trs norte-riograndenses. Os demais presos polticos continuaram aguardando a sua vez. Recebemos de um dos companheiros presos, o local e a senha para a ligao com o PC l fora e aguardamos os guardas que nos levariam at o porto. Uma vez na rua, resolvemos dar umas voltas pela cidade, tomando todos os cuidados para no sermos seguidos.

Tudo ocorreu dentro das normas estabelecidas e ao entardecer, tomamos um trem “Maria Fumaa” rumo a um subrbio longnquo. Chegamos noite a um pequeno stio, onde um cearense nos recebeu amistosamente. Respiramos aliviados. Estvamos “dentro” do partido. O nosso pensamento era voltar o quanto antes para o nosso Estado, enfrentar novamente “as feras”, comear tudo de novo. Na primeira reunio transmitimos direo central esse nosso desejo.

Como resposta nos disseram, “em primeiro lugar os companheiros tero que participar de um curso de capacitao marxista-lenista. Nesse curso os problemas de aplicao da linha poltica do partido sero analisados de forma auto-crtica, luz do marxismo etc, etc. Esse curso dar alguns meses e estamos certos de que todos sairo dele com seus conhecimentos e capacidade de luta reforados. A ento discutiremos com os companheiros onde e como cada um poder dar Revoluo a sua valiosa contribuio”.

Esta notcia me causou a maior alegria. Sempre desejei estudar, isso j foi dividido em duas turmas, funcionando em locais diferentes e independentes. Os instrutores eram, Isidoro, Jlia e um jovem cujo nome de guerra no me recordo, todos trs componentes de uma delegao do Bureau Sul-Americano da IC que se encontrava no Brasil. Como no podia deixar de ser, gente do mais alto gabarito. Os outros instrutores eram membros do CC do partido, dentre eles um operrio tecelo (timo companheiro), de elevada cultura, conhecido como Mauro. Os alunos de minha turma eram militantes do Rio e dos Estados do Rio Grande do Norte, Paraba e So Paulo. A outra turma, da qual fazia parte o Miranda, tinha idntica composio.

O curso desenvolvia-se da seguinte maneira: o instrutor fazia uma exposio sobre um tema programado e em seguida abria os debates, dando a palavra aos alunos, dispondo cada um determinado tempo para expor seus pontos de vista, sua interpretao, concordando ou discordando, de acordo com a natureza do assunto em debate. Era um sistema democrtico, o debate era estimulado ao mximo.

Chegou a vez da discusso em termos da aplicao da linha poltica do BP do Partido. Foram lidos vrios documentos e ficamos sabendo que havia uma crise muito sria na direo. Tinham sido cometidos erros de direita encobertos com frases e atitudes esquerdistas, “obreiristas”. Os debates tinham sido abertos em reunies do Comit Central, surgiram crticas severas, alguns dirigentes no concordaram com as crticas e houve defeces, abrindo claros na direo. Foi lida uma declarao do Secretrio Geral do Partido, o companheiro Astrogildo Pereira, na qual ele dizia no concordar com as crticas a ele dirigidas e assim deixava o cargo ia para as “torrinhas” assistir o desenrolar dos acontecimentos. Anos depois vim a conhecer pessoalmente Astrogildo, tendo guardado a melhor impresso da sua cultura, simplicidade e esprito de companheirismo.

Ns j vnhamos notando uma certa diminuio da atividade da direo, falta de assistncia aos Comits Estaduais, omisses etc., e ali estava a explicao. Entretanto ns os alunos estvamos diante de fatos consumados e s nos sabia analis-los, colher os ensinamentos e apresentar sugestes.

Procurei tirar o mximo de aproveitamento do curso e quando ele terminou, senti que tinha dado um grande o frente na minha experincia e nos meus conhecimentos. Agora era s aguardar o momento de voltar para o meu “habitat”, o nordeste.

Terminado o curso, fiquei numa casa do subrbio, aguardando as agens para meu regresso ao nordeste. Ansioso como estava para retornar ao meu Estado e com a inatividade forada em que me encontrava, os dias avam lentos, enervantes e no aparecia ningum da comisso nacional de organizao com a deciso sobre o meu destino.

Finalmente um dia chegou o Martins. Trazia um ar de mistrio e aps cumprimentos, foi logo me dizendo, “prepare-se para sair, vamos a uma reunio importante”. Todas as reunies no so importantes? Perguntei, tentando torn-lo mais explcito. “esta especialmente importante. voc vai ver”, disse-me sorrindo.

Sem procurar esticar o assunto preparei-me rpido e dentro de poucos instantes estvamos a caminho. Depois de muitas voltas chegamos ao local da reunio. J estavam na sala alguns companheiros. Depois outros chegaram, inclusive o Izidoro, o membro da delegao do Bureau Sul-Americano da IC a quem me referi anteriormente. Eu estava nada mais nada menos, numa reunio do Comit Central do Partido. Eu me sentia feliz em estar ali no meio de tantos “cobras”, mas continuava a no entender nada.

Aberta a sesso o presidente dirigindo-se a mim disse mais ou menos o seguinte:”Temos a satisfao de informar ao companheiro Bangu (era o meu nome de guerra) que a direo mxima do Partido, de comum acordo com a delegao do Secretariado Latino-Americano da IC resolveu eleg-lo, por “cooptao’, membro do Comit Central para ocupar o cargo do Secretrio Geral do PC at prximo Congresso”.

A minha surpresa foi imensa. A emoo tolheu-me a fala por alguns instantes. Eu tinha ento 24 anos de idade, disseram que era um acontecimento indito na histria do PC, eu nunca podia imaginar que tal coisa viesse um dia acontecer.

Procurei retomar o meu auto-domnio e ei a falar: Eu me sinto muito honrado e comovido com a distino e a confiana em mim depositadas. Entretanto, eu pergunto se os companheiros pensaram bem, se no cometeram um erro de super-estimao da minha capacidade, de meus mritos, ao depositarem em minhas mos cargo de tamanha responsabilidade.

A isto respondeu o presidente: “Pode ficar tranqilo companheiro. Tudo foi muito bem pesado e bem medido. Havia outros nomes na lista de candidatos mas foi voc mesmo escolhido. Conte com o nosso apoio e a nossa ajuda. O nosso Partido precisa superar suas falhas e se por altura de sua grande misso. Precisamos ter confiana em ns mesmos e partir para frente. Coragem!”

Estas palavras me causaram um grande estmulo. A reunio continuou mas eu no podia me fixar nos debates. Minha vida sofrera uma guinada brusca, eu senti de repente que tudo ia mudar, a partir daquele momento. Finalmente a reunio terminou. Cada companheiro que se despedia procurava me encorajar.

Ao chegar em casa procurei por em ordem as minhas idias, aos poucos fui recuperando a calma e a confiana. Bem, agora tenho que organizar minha vida aqui no Rio e providenciar a vinda imediata de minha famlia. Tenho que elaborar um plano de trabalho em funo do meu novo cargo de Secretrio Geral do Partido. Tenho que verificar e acompanhar o funcionamento dos secretariados da organizao, de agit-prop, de trabalho sindical e de organizaes de massas, tenho de cuidar da assistncia aos Estudos, JC ao SV tenho que ter uma viso global dos problemas nacionais, tenho que estudar muito! E disse comigo mesmo: “ora, muito bem, “seu” Lauro! Veja s que abacaxi te arranjaram...”

Mas no posso negar, no ntimo eu me sentia feliz. E uma grande vontade de me empenhar com todas as foras na reconstruo do Partido se apoderou de mim.

A situao do pas se agravava rapidamente. O governo provisrio de Getlio ia se tornando cada vez menos provisrio e as bases de uma ditadura iam sendo cravadas em nosso solo. O integralismo se expandia com o bafejo do nazi-fascismo, que estimulava a ao de seus asseclas nativos de dentro e de fora do governo. Os sindicatos eram controlados pela polcia, a represso e a espionagem tornavam a ao dos revolucionrios dura, difcil.

Nesse estado de tenso comeamos a trabalhar. A direo do Partido foi reconstituda, o entrosamento dos antigos membros com os novos promovidos ou a dar os resultados previstos. O Bureau Poltico, ora com 7, ora com 9 dirigentes se reunia periodicamente, analisava os acontecimentos nacionais e traava os planos de ao, dentro da estratgia elaborada pelo Comit Central. Enquanto isso, um secretariado composto de 3 a 5 elementos tinha uma funo opinativa, dinmica, com reunies 2 vezes por semana, acompanhando de perto a execuo dos planos traados. Este secretariado era constitudo pelo Secretrio Geral, a Secretria de Agitao e Propaganda, o Secretrio de Organizao, o Secretrio Sindical ou do Trabalho de Massas, de acordo com as circunstncias.

Havia uma equipe constituda na maioria de ativistas com experincias de trabalho partidrio, com pouca formao terica mas com muita disposio para a luta.

amos a realizar uma poltica de concentrao de foras no trabalho de massas, visando os setores fundamentais da produo, os transportes martimos e ferrovirios, as indstrias principais. Reativamos o trabalho militar, amos a preparar e a enviar reforos para os Estados, com instrues para intensificar o trabalho no campo, como tarefa na mxima importncia.
Nessa poca o oportunismo de direita, tal como acontece hoje na maioria dos velhos partidos comunistas, no existia em nossas fileiras. Havia sim desvios ora de direita, ora de esquerda, que procurvamos combater dentro do nosso entendimento e capacidade ideolgica.

Estvamos plenamente conscientes de que as classes dominantes nunca entregariam o poder “de mo beijada”, jamais renunciariam aos seus privilgios, a no ser pela violncia. Nunca surgiu em nossas fileiras nessa poca, qualquer iluso ou veleidade no que concerne conquista do poder pelas massas populares por outro caminho que no fosse pela luta armada, cairia no ridculo. Para ns, este era o princpio bsico, a concluso lgica do marxismo-leninismo. Dentro dessa perspectiva revolucionria, nossa ao s poderia ser encaminhada no sentido de preparar o Partido para esse desfecho.

Era fundamental para ns nunca perder de vista que o Partido Comunista era um Partido Revolucionrio, no verdadeiro sentido da palavra, um partido que no deveria esperar indefinidamente, na ividade e na burocracia, que o poder viesse s nossas mos por uma ddiva dos cus. Ao contrrio, deveria se preparar e preparar as massas para (com as massas) conquistar o poder, tornando o nosso pas, o nosso povo, livre do jugo imperialista. Teria de criar as bases para as transformaes socialistas, sem outra alternativa que no fosse pela violncia, pela luta armada, nica linguagem capaz de ser entendida “pelos que esto no poder”.

Norteados por estes princpios, a nossa ao no tardou a dar seus frutos. O partido crescia rapidamente, nossos apelos ao povo no sentido de se organizar comearam a ser atendidos, novas foras vieram se incorporar ao, criando as bases para a formao de ampla frente nica, que viria mais tarde a se concretizar.

O fascismo no plano internacional, avanava a os largos para a segunda guerra, na sua tentativa de dominar o mundo e afogar em sangue as aspiraes de liberdade e de progresso de todos os povos.

Para enfrentar essa iminente ameaa, o Partido comunista tinha de realizar um supremo esforo para vencer o seu atraso e se colocar frente das lutas populares, para cumprir sua misso de vanguarda.

A nossa atividade no tinha limites. O excesso de trabalho, as reunies cansativas, as noites mal dormidas, a alimentao nem sempre altura das necessidades, levaram-me depois de certo tempo, ao enfraquecimento fsico e estafa. Uma velha bronquite da infncia que julgava curada, veio tona. O BP achou por bem aliviar minha carga, substituindo-me por Miranda na Primeira Secretaria. Continuei no Secretariado, como Secretrio de agitao e Propaganda depois de uma licena para recuperao.

O Miranda tinha o dom da palavra fcil, era capaz de ar horas a fio dissertando sobre um tema sem se cansar. Juntando este fato ao seu natural dinamismo, acabou conquistando as simpatias e se firmando no posto, ando de secretrio interino a efetivo.

Um membro do BP certa vez, me alertou contra possveis manobras que Miranda vinha pondo em prtica para alcanar o posto. No dei importncia. Achei ridcula e at mesmo indigna de revolucionrios uma luta desse jaez. Eu jamais me envolveria disputa sem princpios, simplesmente pela conquista de postos de direo. E tudo seguiu normalmente, o importante era tocar o trabalho para frente, a nossa ao continuou dentro do mesmo esprito de camaradagem e do mesmo entusiasmo.

Chegamos assim segunda metade do ano de 1934. Foi quando recebemos um comunicado de convocao de um congresso da IC a ser realizado em Moscou. O nosso Partido deveria enviar uma delegao. Foi convocada uma reunio plenria do Comit Central para decidir sobre o assunto. Nessa reunio foram eleitos os cinco representantes: Miranda, eu, Caetano Machado, Elias e Jovino, todos membros do CC. Caetano Machado era um padeiro de Recife, remanescente da Coluna Cleto Campelo. Essa coluna foi o resultado de um levante popular, ocorrido por volta de 1926 em Pernambuco, cujos componentes iniciaram uma marcha para se juntar Coluna Prestes, tendo sido desbaratada por foras governistas e seu lder – Cleto Campelo – morto em combate.

Aqui necessrio um esclarecimento: a IC era organizao que unia todos os PCs do mundo. Funcionava em Moscou obvio, por ser a Unio Sovitica naquela poca o nico pas socialista existente no globo, capaz de permitir o seu funcionamento livre e sem restries. Esta era a 3 Internacional e foi dissolvida em 1943. A 1 Internacional foi criada sob a orientao de Karl Marx, em 1864, com o nome de Associao Internacional dos Trabalhadores. A 2 Internacional surgiu em 1889 e tomou orientao oportunista.

A viagem da delegao a que vnhamos nos referindo, era por conta do nosso Partido e a estadia em Moscou durante a Conferncia era por conta da IC.

O dinheiro estritamente necessrio foi arrecadado pelo nossa organizao e a seguir embarcamos na 3 classes de um navio rumo Frana. Tudo correu normalmente. O pior foi atravessar toda a Europa de trem, incluindo nesse trajeto a travessia do territrio alemo dominado pelo nazismo. Embora nossa documentao e nossa bagagem estivessem em ordem, nas paradas de trem nas estaes, ficvamos quietos e cautelosos nas poltronas, vendo o desfilar arrogante nas plataformas, dos pelotes nazistas, os seus repetidos “Heil Hitler!”, o seu farejar constante de ces de caa.

ramos ageiros em trnsito, sem direito a descer em territrio germnico. Talvez por este motivo ou talvez porque “o faro” dos nazistas no estivesse no estivesse num bom dia, o certo que fizemos a penosa travessia sem atropelos.

No territrio polons a tenso diminuiu. Tivemos que descer em Varsvia e aguardar num hotel outro trem, rumo a uma cidadezinha da fronteira com a URSS. Dois dias depois pisamos em territrio sovitico. Nesse momento os semblantes se transformaram. ageiros que antes se mantinham cautelosos e retrados, agora se abraavam, emocionados, “pela primeira vez em minha vida posso dizer, sem medo de ser preso: “Yo soy comunista!”

Tomamos um novo trem, agora com as insgnias da URSS. A composio ou a correr em direo a Moscou, cortando o lenol branco formado pela neve. Nada de paisagem, somente aquela brancura de doer na vista, a visibilidade reduzida pela nevasca caindo incessantemente.

Depois de horas e horas de ansiedade, chegamos capital da grande nao sovitica. Na gare, j estavam nossa espera Prestes e Silo Meireles. Abraos e palavras acolhedoras de uma recepo simples, mas calorosa. A seguir, tomamos os automveis que nos levaram ao hotel onde ficamos hospedados. Nesse mesmo hotel j residiam h anos, desde que foram exilados, o casal Otvio e Laura Brando e seus filhos.

Eu sa do Brasil convencido de levada uma roupa capaz de enfrentar o frio russo. Para isto tinha comprado o sobretudo mais espesso, o terno mais quente que encontrava nas lojas do Rio e de So Paulo. Puro engano.

Logo que chegamos ao Hotel em Moscou, nossa roupa foi examinada pelos companheiros residentes e considerava inadequada. “A temperatura aqui, costuma descer alm de 30 graus abaixo de zero. Com essa roupa voc pode apanhar pneumonia”. E me fizeram calar umas botas de feltro altura dos joelhos e vestir um sobretudo acolchoado com 3 centmetros de espessura, luvas, gorro de pele etc, etc. somente olhos, nariz e boca ficaram descobertos.

Quando samos rua, principalmente quando paramos por alguns instantes sobre a neve, que verificamos que sem essa roupa teramos virado sorvete.

Nos primeiros encontros no COMINTERN, fomos informados de que o Congresso da IC tinha sido adiado e que em seu lugar seria realizada uma Conferncia dos Partidos Comunistas da Amrica Latina, aproveitando a presena de delegaes do Brasil, Argentina, Uruguai, Chile, Cuba, Bolvia e Mxico.

Poucos dias depois a Conferncia foi instalada num dos sales do velho edifcio sede da IC. O conclave tinha por finalidade realizar um balano da situao dos partidos e das perspectivas revolucionrias de cada pas.

Os debates dividiram-se em duas partes. Na primeira parte foi discutia de forma geral e sem quebra de sigilo, a linha poltica dos Partidos Comunistas latino-americanos, de caractersticas semelhantes, de modo a permitir um intercmbio de experincia, sobretudo no trabalho de massa. No segunda parte, cada delegao debatia entre si, mais detalhadamente, as perspectivas revolucionrias de seu pas e as medidas de organizao a serem adotadas como concluso dos trabalhos da Conferncia. Evidentemente essas decises deveriam ser submetidas direo e ratificadas pelo Comit Central de cada Partido.

No desenrolar da Conferncia o Brasil ou a atrair as atenes dos delegados pela gravidade de sua situao econmica e poltica, pela misria e condies sub-humanas das massas e camadas de sua populao, aguamento das contradies das lutas de classes, perspectivas de uma sada revolucionria para soluo de seus problemas fundamentais a para a libertao do seu povo.

Em princpios de 1935 quando voltamos ao Brasil e Aliana Nacional Libertadora j tinha sido lanada. Sua expanso, em todo o pas, assumiu propores rpidas e imprevistas.
As adeses das personagens de projeo, dentre elas governadores de Estados (Moreira Lima do Cear e Pedro Ernesto do Rio de Janeiro), davam a dimenso e a amplitude da frente nacional que se iniciava. Por outro lado, as caravanas que percorriam os Estados eram recebidas e aplaudidas com entusiasmo pelas massas populares; a palavra de ordem Po, Terra e Liberdade comeou a ser bandeira de luta de camadas cada vez mais amplas da populao.

Surgiam ncleos da A.N.L., surgiam tambm novas organizaes de estudantes, de mulheres e de operrios, enquanto comeava a penetrao entre as populaes camponesas.

Enquanto isso, o integralismo era repudiado, seus comcios eram hostilizados e dissolvidos violentamente pelo povo.

O que se ava no Brasil, naquela poca, no era um fenmeno fortuito, criado artificialmente pela imaginao dos comunistas, como atribuem certos crticos. Era uma crise polticos grande pelo descontentamento geral e que atingia tambm seriamente as foras armadas. Esse descontentamento, mais cedo ou mais tarde, explodiria – como explodiu – em movimentos insurrecionais, dos quais est cheia a histria do Brasil, desde a era colonial.

O que havia de novo nesse perodo importantssimo de nossa histria, era a existncia de um Partido Comunista – jovem e com pouca experincia, mas audacioso e combativo – que se ps frente dessas lutas. Porque nas lutas adas (eu me refiro s de carter insurrecional), ele no participou ou porque ainda existia ou porque, por esta ou aquela razo, no se fez presente. Este fato novo, de capital importncia, o que esses famosos crticos ignoram ou fingem ignorar.

Numa tarde, sa de casa para um encontro com uma companheira da Unio Feminina, na rua Matriz e Barros, em frente ao Instituto de Educao. Eu era assistente dessa organizao. Estava espera no ponto quando notei a presena de dois indivduos mal-encarados que me olhavam com insistncia.

Um deles parecia que j tinha visto em algum lugar, mas no me lembrava onde, pensei que pudessem ser assaltantes mas logo conclu que eram “tiras” e senti instintivamente que ia “entrar em cana”.

Minha primeira preocupao foi evitar que a pessoa que eu esperava chegasse de repente e viesse falar comigo, caindo na esparrela. Procurei me afastar do local e quando andei alguns os os caras vieram na minha direo em manobra envolvente, tentando cortar minha retirada. Achei o procedimento dos indivduos muito estranho e senti rapidamente a necessidade de resistir priso (agresso ou seqestro, sei l), achei por bem tumultuar o local para que a pessoa que eu esperava pudesse se afastar, levando a notcia de acidente nossa organizao.

Instintivamente tomei o cuidado de s me defender, sem nunca atacar. Os “tiras” tentavam me agarrar eu me esquiava; novas tentativas, novas negaas. Apareceram mais pessoas, “fechou-se o tempo”, quando vi tinha se formado em “bolo” medonho em volta de mim, eu no sabia quem era polcia e quem no era. Revlveres brilhando no ar, eu no compreendia donde me vinham as foras para resistir a tanta gente, o certo que uma hora eu estava agarrado, de repente eu estava solto.

O tumulto crescia e se prolongava, parecia no ter fim. Nisto apareceram dois marinheiros e entraram na briga. Na confuso eu pensei que eles estavam contra mim, mas notei que eles me defendiam, no sei o que deu no juzo deles. Acho que ficaram revoltados de ver tantos policiais agredindo um rapaz franzino e desarmado, e que viram logo no se tratar de nenhum marginal; ou talvez, por uma natural averso aos mtodos de violncia policial. Por qualquer uma destas razes ou por outras quaisquer, o certo que eles no tiveram dvidas: entraram no “bolo” em minha defesa, o que foi, pela menos para mim, a idia mais genial que eles devem ter tido em toda a sua vida.

Quando os policiais erguiam os revlveres para me dar coronhadas – uma vez que, atirando corriam o risco de atingir at mesmo os seus colegas – os marujos aparavam o golpe e diziam “no batam no homem! Num homem como esse no se bate!”

J havia mais de trinta pessoais briga, a confuso continuava, o tempo corria e os policiais no conseguiam me levar. Por fim os dois marinheiros propam um acordo (sem que eu fosse consultado...) os policiais me levariam, mas eles acompanhavam at o Distrito, para que no acontecesse nenhuma violncia contra mim. A proposta foi aceita, me pam num carro e me levaram para o Distrito da Praa Saenz Pena. Quando falaram em Distrito da Praa Saenz Pena, respirei aliviado.

Ao entrarmos na Delegacia, um dos “tiras” foi logo dizendo para seus colegas de planto: “arranjem uma jaula para essa fera!” a jaula que me arranjaram foi um cubculo sem cama e sem mveis de espcie alguma. Nesse ponto eu achei que eles estavam com a razo, afinal, para que uma fera quer cama? Os dois marinheiros se mantiveram todo o tempo vigilantes e s depois que fui trancado no xadrez foi que eles se retiraram.

Deitei-me no cho de cimento duro e frio, morto de cansado, e pensei: vejam s quanta ironia, indivduos mau-encarados, armados, suspeitssimos, sem se identificarem, sem apresentarem qualquer ordem judicial de priso legalmente expedida, investem contra um cidado que transita pacatamente pela rua e que no cometeu nenhum crime; tentam prend-lo, agredi-lo ou seqestr-lo (sei l). Esse cidado reage contra a violncia, e no fim ele quem a fera. D pr entender?

No dia seguinte fui levando presena do delegado do Distrito, que registrou o fato no livro de ocorrncias. A seguir fui transferido para a casa da Deteno e l fiquei at que um advogado, por meio de um habeas-corpus, conseguiu minha liberdade.

Lio da histria: se eu no tivesse feito aquela “quizumba” acredito que coisas mais graves teriam me acontecido.

Linhas atrs, manifestei a hiptese de ter sido vtima de seqestro, no incidente descrito. possvel que algum considere isto fantasia, na suposio de que este tipo de violncia seja coisa de nossos dias. Para elucidar vou citar um fato ocorrido naquela poca, ressalvando-se a impreciso nos detalhes, pois tenho que recorrer exclusivamente minha memria, ados quarenta e tantos anos.

O jornalista e humorista Aparcio Torelli – o “Baro de Itarar” – destacou-se pelas suas crticas maliciosas ao regime discricionrio de ento, atravs de seu jornal “A Manh”. Certo dia ele teve seu escritrio invadido por indivduos armados que dizendo-se da polcia, prenderam-no e conduziram-no de olhos vendados, num carro, para local ignorado. Nesse local espancaram-no, rasparam-lhe a cabea e submeteram-no a toda sorte de humilhaes. Depois, largaram-no numa estrada deserta. Voltando ao seu local de trabalho, o “Baro” continuou normalmente a sua atividade, sem se deixar intimidar e colocou na porta um cartaz com as caricaturas dos seqestradores espancados a vtima, e mais estes dizeres: “ENTRE SEM BATER”.

Antes de reiniciar minhas atividades, tive um encontro com Miranda. Depois de falarmos sobre vrios assuntos, ele me comunicou que a cpula estava preocupada com a minha segurana, em face dos ltimos acontecimentos e que eu deveria me ausentar do Rio por alguns tempos, para “despistar a polcia”. Disse que a Bahia estava precisando da ida de uma pessoa experiente para levantar o Partido, que estava em crise, e que eu era a pessoa indicada etc, etc. e perguntou o que eu achava. Respondi-lhe que era um militante do Partido sempre pronto a cumprir suas decises. E que a tarefa difcil desde que necessria, era um desafio e ao mesmo tempo um estmulo para mim.

Alguns dias depois dessa conversa, eu estava viajando para Salvador. A situao do Partido na Bahia, era pior do que eu imaginava e do que informara Miranda. Havia dois companheiros enviados do Rio Ferreira e Bag, mas o Comit Estadual no funcionava.

Nas primeiras cartas que enviei ao Secretariado Nacional, informei com detalhes sobre essa desorganizao. No podia mesmo que porventura o quisesse dar informaes baluartistas, como estranhamente diz o falecido Lencio Basbaum no seu livro de memrias. Simplesmente porque a direo nacional j estava inteirada dessa desorganizao, tanto assim que fui enviado para aquele Estado justamente com a misso de levantar o Partido. Lembre-se de que Miranda era o Secretrio Geral do Partido e era baiano. Por estas razes era impossvel que no soubesse, pelo menos por alto, o que havia em seu Estado natal.

Como sempre fui otimista com relao s possibilidades de criao de organizaes revolucionrias, achei que a misso de reorganizar o Partido na Bahia era Perfeitamente realizvel e uma questo de tempo, bastando para isto que tivssemos confiana no povo trabalhador, que no tivssemos medo dele (como alguns pretensos polticos parecem ter), que falssemos na sua linguagem, dos seus problemas e de suas aspiraes. Dizer simplesmente que no existia nada e deixar que continue a no existir, uma atitude conformista. Quando no existe nada, a gente procura criar. E se houver fora de vontade e persistncia, a gente acaba criando.

Quem disse que no existia nada estava exagerando. Havia alguns elementos e com eles traamos um plano de trabalho muito simplesmente de acordo com as possibilidades do momento, tendo como tarefas imediatas: 1) recomposio de um CE pequeno, prtico e ativo; 2) montagem de uma tipografia clandestina para tiragem de manifestos e outros impressos, atravs dos quais pudssemos transmitir mensagens a certas camadas da populao.

Com referncia ao primeiro item, conseguimos formar um CE com apenas 3 elementos inicialmente, e comeamos a faz-lo reunir. Quanto ao segundo item, tnhamos um prelo e algumas caixas de tipo e tnhamos o tipgrafo. Faltava alugar uma casa, comprar mveis e material. E para isto faltava o dinheiro.

Lencio Basbaum, antigo membro da direo nacional do Partido Comunista, estava na Bahia, em boa situao financeira, dono de uma ou vrias lojas varejistas. Eu o conhecia desde 1925, 1926, somente atravs de cartas, quando eu estava no Rio Grande do Norte e ele no Rio e era atravs dele que eu recebia instrues do partido para o trabalho de organizao da JC de cujo primeiro ncleo criado eu estava frente. Procurei Lencio e pedi a sua ajuda financeira para montar a tipografia clandestina, no que fui atendido.

Eu estava informado, desde quando assumi a primeira secretaria nacional do PC em 1933/1934, que Lencio afastara-se da direo do partido por divergncias e posteriormente, foi expulso por ter participado de lutas fracionistas contra o Partido. Mas como eu no participei das reunies em que esta deciso foi tomada e no estava suficientemente inteirado do seu caso, julguei por bem dar-lhe um crdito de confiana, sob minha inteira responsabilidade. Comuniquei e submeti a questo da deciso do Secretrio Nacional, o qual ratificou a minha atitude.

Com a ajuda financeira do Lencio, montamos a imprensa clandestina e comeamos a imprimir prospectos e inclusive fizemos uma reedio do jornal, rgo do Comit Central do Partido.

Tudo era feito com as maiores dificuldades, no s pela escassez de militantes, como tambm pela prpria natureza do trabalho ilegal. Com minha volta sbita ao Rio, como era relatado mais adiante, evidentemente as coisas se tornaram mais difceis.

Em novembro de 1935, eu apenas iniciara meu trabalho na Bahia, quando a imprensa escrita e falada comeou a divulgar as notcias sobre os levantes de Natal, Recife e Rio.

Essas notcias me causaram um grande espanto. O que estava ocorrendo era para mim, inesperado e confuso. Embora eu me desse conta de que estvamos vivendo, especialmente no nordeste, uma situao explosiva, no podia entender aquela seqncia de levantes, virtualmente anulando o fator surpresa, que poderia ser decisivo a nosso favor. Como tambm no entendia porque a insurreio partia da periferia e no do centro, dos quartis e no das massas.

Entretanto, o que mais me desgostava, era o fato de eu estar fora da ao, sem nenhuma condio de participar pessoalmente da luta. Tive que me confortar com a condio de expectador, em vista das condies desfavorveis em que nos encontrvamos na Bahia. Resta-nos agora, fazer um ligeiro retrospecto dos acontecimentos, como ponto de partida para uma anlise maus substancial no futuro.

J em 1931 o 21 BC sediado em Recife, havia se revoltado tendo sido dominado e, em conseqncia, transferido para Natal. O 29 BC que estava em Natal, foi mandado para Recife. A troca deu o seguinte resultado: em 1935, enquanto o 21 BC se revoltava em Natal, o 29 BC tambm se levantava em Recife.
O Exrcito atravessava um perodo de inquietao em face de um antigo regulamento militar que permitia o desligamento de cabos e sargento aps oito anos de servio ou por limite de idade. Os cabos e sargentos lutavam pela revogao dessas medidas. Mais precisamente, era a continuao do antigo descontentamento que culminou com as revoltas tenentistas de 22, 24 e 26, e que a chamada “revoluo de 30” no conseguiu resolver.

No dia 23 de novembro ou seja, dois dias depois do levante de 1935, a Guarda Civil de Natal havia sido dissolvida sem mais nem menos, atirando ao desemprego centenas de pessoas, dentro as quais muitos chefes de famlia. Esses homens, com instruo militar, vieram engrossar as fileiras dos descontentes.

O levante de Natal, embora tendo partido do quartel, teve a participao no s de soldados, cabos e sargentos, mas tambm a adeso popular de operrios, funcionrios pblicos e inclusive de mulheres, que lutaram bravamente de armas na mo nas ruas de Natal.

Em Recife, apesar de inesperado, o levante teve tambm a participao de populares, inclusive de crianas. “Em Olinda, um grupo de civis conseguiu apoderar-se dos pontos estratgicos. O prefeito, o delegado e outras autoridades foram presos”. “Lamartine resistiu, com dezoito homens, de onze horas da manh de domingo at as duas horas da tarde: eram populares, inclusive crianas, que faziam o reabastecimento das posies rebeldes, correndo perigosamente de um ponto para outro. Uma delas caiu ali mesmo, cortada pela metralha”. (Hlio Silva, “A Revoluo Vermelha”, Civilizao Brasileira, p. 302-308).

No Rio, por incrvel que parea, no houve participao de Civis. O 3 RI revoltou-se, dominou a situao no quartel, prendeu toda a oficialidade mas ficou impossibilitado de se locomover da Praia Vermelha, devido o cerco. No houver sequer um grupo de combate de civis, que sasse rua e tentasse impedir que esse cerco se completasse. Na Escola de Aviao, outro foco de revolta militar, ocorreu idntica situao.

As causas da misria e do atraso das populaes nordestinas – o latifndio, as secas e a falta de assistncia aos pequenos e mdios lavradores e criadores – continuavam sem soluo. O descontentamento popular em conseqncia, j vinham crescendo h anos e s vezes nos perodos de secas, resultavam em ataques s feiras e trens de mercadorias pelos flagelados. Nas ribeiras do Morros e do Assu tinham surgido os primeiros focos de guerrilhas operrio-camponeses encabeados por Miguel Moreira, Manoel Torquato e outros.

Do ponto de vista nacional, contriburam para o agravamento da situao, fechamento da Aliana Nacional Libertadora – a maior organizao de frente nica j criada no pas e a expanso do integralismo, com a ajuda do nazifascismo e sob o beneplcito oficial.

Todos esses fatos indicam que existia, naquela poca, uma situao favorvel s exploses de revoltas parciais e locais, antes que tivssemos atingido o ponto culminante para uma insurreio de carter nacional, com possibilidades do assalto final para a tomada do poder, tanto do ponto de vista da radicalizao e politizao das massas, como da preparao do Partido e das foras de vanguarda.

Segundo depoimento de vrios participantes do levante de Natal, os lderes militares, em novembro de 35 estavam dispostos a irem luta com ou sem a participao do PC. Em face dessa alternativa, poderamos indagar: era possvel ter evitado o levante de Natal? Talvez sim. Pelo menos o Partido deveria ter feito todo o possvel para adi-lo. A partir do momento que no consegussemos impedir ou adiar o levante, seria justo cruzamos os braos, negar o nosso apoio e participao? Isto seria indigno de um partido revolucionrio e resultaria na sua total desmoralizao perante as massas. No devemos justificar nossos erros. Mas, as lamentaes no conduzem a nada de proveitoso.

Do ponto de vista da experincia e do amadurecimento da conscincia poltica do povo brasileiro, a revoluo de 1935 constitui “o fato mais importante” de toda a nossa histria.

Aquele ms de novembro de 1935 valeu mais, do ponto de vista da conscientizao do nosso povo, do que todos os longos anos de pregao feita nesse sentido. No sei mesmo, que espcie de ENSAIO poderia ter sido mais valioso para a formao e o amadurecimento da conscincia revolucionria do povo brasileiro do que as jornadas hericas de novembro de 1935.

A reao procura por todos os meios, desvirtuar o verdadeiro carter daquele movimento, chamando-se de “intentona comunista”. Tenta difamar e caluniar os seus participantes e os seus lderes, com estrias fantsticas de assassinatos de oficias dormindo, quando todo mundo sabe ser isto impossvel, diante do fato de que todos os quartis estavam de prontido, de sobreaviso.

Tanto na poca da insurreio de 35 como nos anos posteriores, durante o Estado Novo fascista e at os dias atuais, essa campanha difamatria e caluniosa dos meios reacionrios vem sendo secundada pelo “trabalho” sistemtico desenvolvido no mesmo sentido pelos falsos tericos, pelos grupelhos trotskistas e divisionistas de vrios matizes. A pretexto de realizar a crtica e de escrever a histria, deturpam os fatos, mentem descaradamente e procuram jogar lama nos lderes e militantes dessa fase difcil, mas riqussima de experincia, de nossa histria revolucionria, no poupando sequer a memria dos nossos heris e mrtires trucidados pela polcia.

Estamos certos de que as novas geraes sabero colher a experincia e o estmulo decorrentes do nosso gesto, da nossa atuao e do nosso sacrifcio. Em toda derrota h um germe para futuras vitrias. isto que precisamos entender. No h presente sem ado. No haver futuro sem presente.

Os revolucionrios de 35 deram ao povo brasileiro em exemplo de iniciativa, audcia e de bravura. Mostraram – e isto fundamental – que no se combate o fascismo com simples palavras, que a luta contra o regime de explorao e opresso no se faz com conversa fiada.

intil tentar jogar areia nos olhos do povo. O povo brasileiro no uma criana e j conhece esse tipo de engodo. Toda anlise das nossas lutas adas s ser til se for feita de forma honesta, sem paixo, com esprito construtivo. As campanhas difamatrias, as calnias e os embustes s podem interessar ao sistema vigente, sua mquina brutal repressiva.

No dia 23 de novembro de 1935, sbado ao meio dia, irrompeu a revolta no quartel do 21 BC em Natal. Os revoltosos dominaram fcil a situao. O Cel. Jos Otaviano foi para o quartel da Fora Pblica onde organizou a resistncia, com a participao do Major Luiz Jlio, comandante da Fora Pblica. A resistncia durou at a manh do dia seguinte, dia 24.

Dominada a situao, assumiu o governo uma junta revolucionria assim constituda: “aprovisionamento” – Jos Praxedes de Andrade, operrio sapateiro; “defesa” – Quintino Clementino de Barros, Sargento; “interior” – Lauro Corts Lago, funcionrio; “viao” – Joo Galvo, estudante; “finanas” – Jos Macedo, funcionrio dos Correios e Telgrafos.

Nas oficinas do antigo rgo oficial “A Repblica” foi impresso, sob a direo do professor Raimundo Reginaldo da Rocha, o primeiro e nico nmero do jornal “A Liberdade”, rgo do novo governo revolucionrio. Este jornal divulgou um manifesto ao povo, com as diretrizes e com a palavra de ordem, “Todo o poder ANL, Aliana Nacional Libertadora.”

Por ordem do governo, foi feita a distribuio gratuita de alimentos populao necessitada e faminta. A revoluo se estendeu rapidamente pelo interior, chegando a dominar as cidades e vilas vizinhas de Macaba, Cear Mirim, So Jos de Mipibu, Vila Nova, Lagoa de Montanha, Nova Cruz, Goianinha, Canguaretama, as, So Gonalo, Santa Cruz e Ars.

Em Natal durante o levante, um grupo revolucionrio dirigido pelo professor Raimundo Reginaldo da Rocha e sua filha Amlia, jovem de 18 anos aproximadamente, atacou d dominou um foco de resistncia, a Cadeia Pblica. Durante o ataque os presos foram libertados.

Continuava o meu trabalho na Bahia, no sentido de reerguer o Partido, quando recebi uma carta do Secretariado Nacional, dizendo para que eu seguisse com urgncia para o Rio.

Imediatamente comuniquei o fato ao CE da Bahia h pouco reconstitudo, a quem ei a ligao da tipografia clandestina que estava sob minha responsabilidade. Recomendei tambm ao companheiro Ferreira, tipgrafo, que procurasse o Basbaum que era mdico, para tratamento de sade, pois estava com sintomas de impaludismo. E parti para o sul, preocupado com o trabalho apenas iniciado em Salvador e que no houve tempo de consolidar.

Chegando ao Rio entrei em contato com o Secretariado Nacional e fui informado dos motivos do meu chamado. Disseram-me que por indicao de Prestes, eu fora designado para ocupar o cargo de Secretrio Geral do Partido, em substituio a Miranda, que tinha sido preso. Pela segunda vez assumi o mais alto posto do PC, premiado pelas circunstncias, sendo que desta vez numa situao muito mais difcil e dramtica.
Depois da derrota de insurreio de novembro de 35, as prises comearam a atingir os membros da cpula: Berger, Ghioldi, Miranda e outros tinham cado. Embora o aparelho dessa cpula, inclusive o de Prestes, fosse independente da nossa organizao, ns vivamos em constante sobressalto. A caa a Prestes pela polcia era sentida at no ar.

Fizemos a recomposio do Secretariado Nacional e amos ao com o mximo cuidado para evitar novas quedas. O fundamental era fazer todo o possvel para que a direo nacional do partido continuasse funcionando, em contato com os Estados, mantendo a unidade orgnica e poltica. A situao era difcil, a represso policial e a espionagem tornavam a atmosfera pesada. Mas amos tocando para a frente.

Estvamos traando um novo plano de trabalho, quando ocorreu o desastre: “a priso de Prestes”. Os detalhes de priso da Prestes se espalharam rapidamente, de boca em boca. A gente via o povo andando nas ruas, calado e triste. Ficamos sabendo que a polcia cercou e invadiu a casa da rua Honrio e ao apontar as metralhadoras contra Prestes, Olga Benrio sua esposa, abriu os braos num gesto espontneo de proteo.

Tempos depois outra notcia estarrecedora se espalhou, Olga Benrio Prestes foi entregue ao nazismo pela ditadura de Vargas. E num campo de concentrao da Alemanha ela foi assassinada, depois que deu luz a uma filha, Anita Prestes. Anita foi arrancada das garras do nazismo pela campanha mundial que se fez em sua defesa, encabeada por dona Leocdia, me de Prestes.

Nas primeiras reunies que tivemos do Secretariado aps a priso de Prestes, decidimos continuar funcionando normalmente, no Rio. Mas em vista de jornais terem publicado fotografias de alguns de nossos companheiros, essa deciso tornava-se difcil e arriscada. Tivemos que tomar outra resoluo, a de transferir por algum tempo a direo nacional para Recife.

A operao mudana no era fcil, pois no havia estradas de rodagem naquela poca e, conseqentemente, o transporte terrestre era uma aventura. Mesmo assim, decidimos que dois seguiriam por terra, eu e o Martins e os outros membros do Secretaria seguiriam por via martima. O plano foi traado e cuidadosamente executado. Uns dois meses depois de ter sado do Rio, a Direo Nacional estava funcionando na cidade do Recife.

O primeiro Estado com o qual estabelecemos ligao foi o Rio Grande do Norte. A represso al, como nos demais Estados do Nordeste, colocava nossas organizaes partidrias na defensiva, funcionando a duras presas. Os melhores militantes estavam presos, deportados ou foragidos. Mesmo em Recife, onde precisvamos ter uma base de apoio, o partido ressentia-se da falta de quadros para uma reestruturao mais firme.

Algumas dvidas que ainda tnhamos, quando samos do Rio, quanto eventual existncia de focos de luta armada pelo interior, se desvaneceram. Os remanescentes dos levantes de Natal e de Recife que tentaram marchar para os sertes, tinham sido destroados e apanhados por tropas que, alertadas, vinham em sentido contrario. Algumas delas andavam perseguindo Lampio.

Longe do centro poltico do pas, o Rio de Janeiro, a Direo Nacional sentia-se deslocada e meio fora de ao. Tnhamos ido para Recife em carter provisrio, mas agora era preciso abreviar o nosso retorno.

De qualquer maneira a nossa ida ao nordeste foi til no s do ponto de vista da segurana mas tambm pelo contato que tivemos com a real situao partidria. amos mais alguns meses em Recife, preparando com calma, as condies para a volta. O nosso destino agora era S.Paulo.

No obstante vivermos num clima de constantes apreenses e de dificuldades sem conta, nunca descuramos o nosso trabalho de direo em todos os setores de atividade, dentro dos limites de nossa compreenso, dos recursos e das possibilidades de que dispnhamos. Por mais que os agentes da reao – os trotskistas e divisionistas de varias faces – tentem denegrir o nosso ado, no podero encobrir nem deturpar os fatos por muito tempo, a verdade acabar emergindo.

Vamos citar um episdio que ficou gravado para sempre em nossa histria. Em 1936 rebentou a guerra civil na Espanha. Havia nesse pas um governo de coaliso recentemente eleito que programou realizar grandes reformas sociais, pondo fim ao domnio de uma oligarquia aristocrtica, retrgrada e medieval que atravs dos sculos, vinha mantendo a Espanha como um dos pases mais atrasados da Europa.

As ditaduras nazi-fascistas da Alemanha e da Itlica tramaram a derrubada desse governo. Armaram seus tteres, os generais da quinta coluna falangista, os Franco e companhia. E estes traidores se sublevaram e abriram caminho para os tanques, avies e tropas mandados por Hitler e Mussolini.

O povo espanhol e seu governo no estavam preparados e no puderam conter foras to poderosas. E a guerra civil espanhola tornou-se uma das mais encarniadas que se conhece. O nosso Partido Comunista reuniu e deliberou prestar todo apoio e ajuda ao povo irmo. A consulta foi feita e da Espanha veio a resposta, “Dispomos de gente suficiente para combater. Precisamos de oficiais e tcnicos”.

Foi nessa ocasio que se verificou o elevado grau de conscincia e desprendimento dos nossos companheiros militares. Foram muitos os que, deixando aqui suas famlias e seus interesses pessoais, se pontificaram a seguir. E partiram incontinenti para a Espanha, onde tiveram atuao destacada nos combates: Carlos da Costa Leite (que foi promovido a major pelo governo espanhol), Guei da Cunha, o tenente Frana, Correia de S, Apolnio de Carvalho e outros.

Apolnio de Carvalho, depois que terminou a guerra espanhola, permaneceu vrios anos na Frana participando, com sua esposa da resistncia ao nazismo, sendo ambos condecorados por atos de bravura.

Depois de uma ligeira parada no Rio seguimos para S.Paulo, onde a direo do Partido pretendia se estabelecer por um longo perodo. Chegamos a S.Paulo e tivemos que cooptar trs elementos para recompor o Bureau Poltico, sendo um deles o secretrio do CR de So Paulo como era de praxe; e outros dois para substituir em carter temporrio Martins e Lacerda que estavam em Moscou. Os trs cooptados foram os seguintes: Paulo (Hermnio Sacheta), Luiz (Hlio Manna) e Barreto (Heitor Ferreira Lima). Todos indicados pelo Comit Regional. Hlio Manna e Sachetta ficaram incumbidos do setor de finanas, funo que j vnhamos exercendo.

Fizemos restries ao Barreto porque era do nosso conhecimento que ele j tinha pertencido a Direo Nacional nos dois de 32-33 e fora expulso do Partido por atividades divisionistas. Achamos estranho que ele tivesse voltado ao Partido em S.Paulo, sem que a direo nacional tivesse sido avisada. E s depois de muitas explicaes e justificativas por parte do CR foi que resolvemos aceit-lo.

Transcorria o ano de 1937. Contrariando os desejos continuistas de Vargas, o problema de eleies para presidente da Repblica veio tona. Atravs da imprensa, as correntes polticas aram a uma ao mais concreta, as presses culminaram com o surgimento dos primeiros candidatos. Primeiro surgiu Armando Sales de Oliveira, com o apoio do antigo PRP. Depois surgiu o nome de Jos Amrico, ligado a setores da antiga Aliana Liberal e apoiado por um grupo de intelectuais de esquerda.

Os fatos indicavam que os planos de Getlio eram de evitar eleies e continuar no poder, reforando a ditadura. E para ganhar tempo, seus pregoeiros criavam ime impugnando os candidatos surgidos e reclamando um “tertius” que – embora no declarassem – no era outro seno o prprio Getlio.

Foi convocada uma reunio do Bureau Poltico para debater o problema. reunio compareceram os titulares Bangu, Morena, Cmara Ferreira, Elias, Dreifus, Xavier, Paulo Sachetta, Luiz (Hlio Manna) e Barreto (Heitor F. Lima). Abrindo os debates sobre a ordem do dia, as eleies, o Secretariado pela voz de Bangu apresentou os seguintes pontos de discusso: Primeiro: O inimigo principal, no pas, contra quem devamos concentrar o nosso ataque era “a ditadura”; Segundo: Um balano da correlao de foras entre a revoluo e a contra revoluo, indicava que o PC atravessava uma fase difcil, decorridos dois anos apenas da derrota da insurreio de 35, lutando pela sobrevivncia e para conquistar e manter um mnimo que fosse de contato com a massa; Terceiro: Para tentar frustrar os planos de continuao e reforamento da ditadura, o PC devia lutar pela vitria de um candidato presidncia da Repblica que tivesse maior possibilidade de restabelecer as liberdades democrticas. Esse candidato, de um a plataforma de governo que inclusse um mnimo de programa de interesse nacional popular.

O “trio” Paulo-Luiz-Barreto, usando plenamente do direito de defender suas opinies, apresentou a tese da eqidistncia com relao aos candidatos presidncia ou seja: “o no envolvimento” do PC na campanha eleitoral, a no ser para desmascarar a todos, pondo no mesmo saco a ditadura e os candidatos que pretendiam substitu-la. Isto significava que o PC, segundo interpretamos, devia se meter no casulo da falsa pureza ideolgica, cruzando os braos. Essa atitude, “por estranha coincidncia”, correspondia perfeitamente aos interesses continuistas da ditadura.

Mas, os defensores da eqidistncia no podiam se queixar: tiveram toda liberdade de defender seus postos de vista, certos ou errados. S que depois de longos debates, na hora da votao ficaram em minoria, s os seus trs votos apareceram.

Aparentemente saram conformados da reunio, como justo e democrtico. A minoria se submete a maioria, e toca pr frente. Dias depois eles lanaram manifesto ao pblico, com ataques ao Partido e acusaes pessoais e caluniosas aos seus dirigentes, citando alm dos pseudnimos, os nossos nomes verdadeiros. E o mais importante: levaram todo o dinheiro do Partido que estava em seu poder, pois eles como foi dito, eram tesoureiros.

O golpe foi violento e traioeiro. A situao ficou difcil para ns sob todos os pontos de vista, inclusive da segurana. No tnhamos recursos, nem aparelhagem suficiente e nem tempo para convocao de uma conferncia nacional. Era urgente tomar uma deciso. Alguns dirigentes de nosso Partido, Honrio, Fernando Lacerda e outros, estavam em Moscou. Havia uma organizao, a IC qual nosso PC era filiado. Por que no apelar para sua deciso?

Reunimos o Secretariado Nacional e decidimos reunir todos os impressos publicados pelo grupo divisionista e todo o material editado por ns. Designamos um membro do Secretariado, Xavier, para ir a Moscou levando todo esse material para que a IC com a participao dos nossos dirigentes que l estavam, decidisse sobre o que estava ocorrendo em nosso Partido. Como Secretrio Geral e como principal acusado pelo “trio” divisionista, escrevi uma carta pondo meu cargo disposio do Partido e da prpria IC. Nessa carta eu dizia que continuaria desempenhando minhas funes at ser substitudo.

Logo que o nosso emissrio chegou ao seu destino e fez a entrega do material acompanhado do seu relatrio verbal, a rdio de Moscou, que naquela poca era muito ouvida no Brasil, comeou a irradiar uma mensagem expulsando o grupo divisionista-trotskista: Paulo (Hermnio Sachetta), Luiz (Hlio Manna) e Barreto (Heitor Ferreira Lima). Com isto estava liquidado a faanha do grupelho, desmascaradas as suas mentiras e calnias.

Quanto minha renncia, no foi sequer tomada em considerao. Pela terceira vez tive que assumir o cargo de Secretrio Geral do PC sem nunca ter pedido ou feito qualquer empenho para tal, muito embora eu me sentisse honrado com a distino, no vou agora me acobertar com o manto da falsa modstia. Tambm nunca me queixei do peso que carreguei nos ombros durante tantos anos. Os apertos e as agruras que ei fazem parte da luta, acho tudo muito normal num partido revolucionrio de vida ilegal, que sofre toda sorte de restries e de dificuldades.

Quanto s ofensas e calnias que os provocadores e divisionistas infiltrados nos dirigiam, no nos causam surpresas. Afinal de contas, o trabalho do aparelho da represso no consta somente da agresso fsica, de prises e torturas. Outras formas sutis de agresso so postas em prtica, na v tentativa de desmoralizar a revoluo e seus lderes. Isto sempre ocorreu no mundo inteiro.

Tais ataques e injrias, partindo de trnsfugas e inimigos declarados da classe operria, tm razo de ser, se apresentam dentro de uma certa lgica. Se em vez desses ataques e calnias, esses indivduos nos dirigissem elogios, a sim, ns ficaramos bastante surpresos e seriamente encabulados.

O que importante ressaltar, a ressaltar, a firmeza com que o nosso Partido reagiu diante das provocaes do grupelho trotskista. Apesar de debilitado pelos golpes sucessivos desferidos pela ditadura, o PC se manteve coeso e disciplinado, destacando-se a campanha eficiente de Otvio e Laura Brando, atravs da Rdio de Moscou.

Voltemos ao assunto da campanha para as eleies de 37, que serviu de pretexto para toda a ao nefanda do grupo divisionista. No houve apoio do PC a nenhum candidato, simplesmente porque deixaram de haver candidatos. Como todos sabem, no houve eleies presidenciais de 1937. Getlio deu o golpe, como se esperava. A ditadura do “Estado Novo” tomou novo impulso e a histria novos caminhos.

Depois dos acontecimentos de So Paulo, a direo nacional do Partido voltou para o Rio, disposta a ficar em definitivo. E realmente ficou de fins de 1937 a princpios de 1940.

Este foi um perodo dos mais duros de nossa histria. Isto porque a partir do golpe branco de 37 que o famigerado Estado Novo atingiu seu auge, com a criao do seu respaldo jurdico, com o controle absoluto da imprensa falada e escrita atravs do DIP, com o domnio dos sindicatos e organizaes de massa pela polcia poltica, com a espionagem generalizada e com a represso fascista mais brutal.

Apesar de tudo, a direo do Partido conseguiu se firmar no Rio de Janeiro, montando seus aparelhos, sua imprensa ilegal, penetrando nas empresas, reatando suas ligaes com os Estados. O ambiente era tenso, de terror e de guerra e era nesse clima que tnhamos de trabalhar. Era preciso esclarecer a opinio pblica, dizer em manifestos e jornais ilegais o que no era possvel divulgar legalmente, concitar o povo para a luta contra o inimigo comum da humanidade, o nipo-nazi-fascismo. E isto tinha que ser preparado na absoluta clandestinidade, sabendo cada um de antemo, o que nos aguardava, caso fssemos presos, sabendo claramente que ramos todos candidatos s cmaras de torturas dos carrascos de Felinto Mller.

Foi com esse objetivo que instalamos nossa tipografia (mais uma) na rua Engenho do Mato, em Toms Coelho, onde foram residir o companheiro Jlio Barbosa, sua esposa D. Alice e filhos menores.

Jlio e D. Alice – de saudosa memria – eram um casal que conquistava amizade logo aos primeiros contatos. Havia um entendimento perfeito entre ambos, no era preciso argcia para se perceber que eles se amavam seriamente. Numa poca de expectativas e sobressaltos, a calma dos dois era absoluta, viviam como se nada existisse de anormal em redor. Sabiam manter uma prosa agradvel, era um prazer conviver com eles.

Eu morava na ocasio na Piedade e fazia diariamente o trajeto p de casa at a oficina ilegal, ando pela Botija e pela estao Toms Coelho, levando os originais para compor e imprimir. Ensinei ao Jlio Barbosa a profisso de tipgrafo e ele ou a tomar conta do servio. Mas o material tipogrfico era insuficiente, eu tinha que ajud-lo. Tinha que corrigir provas e fazer clichs em madeira, canivete (xilogravura), no s para suprir a escassez de tipos para os ttulos, como tambm para a ilustrao do jornal. A tarefa mais difcil era fazer um velho prelo funcionar sem barulho, quando sua maior reivindicao era a aposentadoria.

Mas, o material saa. Jornais e manifestos, aos milhares, eram entregues ao aparelho de organizao para a distribuio. Outros candidatos voluntrios s salas de torturas transportavam esse material em trens, navios ou caminhes para os mais longnquos rinces do pas. E assim, a mesma palavra de incentivo e de orientao podia ser lida pelo trabalhador amazonense, nordestino, gacho ou paulista. E esses leitores annimos tambm eram candidatos eventuais s salas d tortura, porque algum que fosse encontrado com um desses impressos era o suficiente para ser considerado suspeito de comunista e levado aos pavorosos tomentos medievais.

Os candidatos s salas de torturas no eram grupos isolados de aventureiros e visionrios. Eles faziam parte de uma cadeia imensa e poderosa espalhada por todos os pases do mundo, disposta a esbarrar por todos os meios o avano da hordas fascistas e assegurar o triunfo das foras do progresso e do socialismo.

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