Multidias
Edio/Maro/2002 573fy
OMBUDSMAN
Requisitos para a autonomia
do Ouvidor
Rubens
Pinto Lyra
Ouvidor
da UFPB
A
Ouvidoria um instrumento de controle social,
devendo-se entender esta expresso como de controle
da sociedade (comunidade universitria e pblico
externo, no nosso caso) sobre a istrao.
Esse controle visa contribuir para que os princpios
de transparncia, economicidade, celeridade
e eficcia que regem, em tese, a istrao
pblica brasileira, - embora estejamos de
fato, h anos luz disso se tornem, na
prtica, eixos norteadores da prestao de servio
pblico.
En
ant, devo dizer que considero o sub-produto
desse controle a participao cidad na gesto
pblica to ou mais importante que os objetivos
formais consignados Ouvidoria, pelo fato dessa
participao trazer embutida um rico aprendizado
pedaggico de carter poltico.
Este,
com efeito, transmuda a ao do particular que,
acionando a Ouvidoria, investe-se, de certa
forma, do munus pblico, revestindo sua
demanda, originariamente fundada numa leso
privada, do manto da indumentria pblica.
Tal prtica introjeta no cidado ativo elementos
de compreenso do que seja interesse universal
e res publica.
Todavia,
existem duas pr-condies para o funcionamento
idneo da Ouvidoria: alm da credibilidade do
seu titular, devida sua qualificao profissional
e conduta tica, a existncia de garantias e
prerrogativas que tornem efetivas a autonomia
que, nas Ouvidorias democrticas, como a da
UFPB, lhe formalmente atribuda.
nesse ponto que a a porca torce o rabo.
A
istrao pblica a includa a UFPB
no se sente muito vontade com a ao da Ouvidoria.
Do mais alto escalo, ando pelos nveis
intermedirios e inferiores, muitos no a respeitam,
desconsiderando completamente os prazos estabelecidos
para a resposta s interpelaes desse rgo.
Em
assim sendo, como fica o usurio? Com efeito,
tendo confiado nessa inovao institucional
como instrumento capaz de vocalizar as suas
reclamaes e propostas, tem como resposta o
silncio ensurdecedor do dirigente, que teme
tomar posio e se desgastar. Ou igualmente
deplorvel que no responde por negligncia
ou desateno.
A
primeira vista, quem consultar a norma que rege
a Ouvidoria pode pensar que esta garante ao
Ouvidor pronta resposta do dirigente pois que
este, no retornando ao titular da Ouvidoria
estar sujeito apurao de sua responsabilidade...
mediante representao do Ouvidor Geral. (Art.
19o da Resoluo 003/2001 do CONSUNI).
Ldo
engano. Primeiramente, por no ser factvel
que o Ouvidor, para garantir a resposta dos
dirigentes, esteja a todo momento solicitando
aberturas de sindicncia, obrigado a utilizar
rotineiramente um recurso que, por natureza,
tem carter excepcional (e que alis, at agora
no foi acionado).
Alm
do mais, o Reitor tanto pode acolher quanto
rejeitar as representaes do Ouvidor.
Por
fim, a apurao da responsabilidade no alcana
o dirigente mximo, que fica, na prtica,
a salvo de qualquer tipo de cobrana e de obrigao
de resposta.
O
que compromete a atuao do Ouvidor, enquanto
indutor de mudanas, considerando-se que o Reitor
pode e o faz com freqncia no dar encaminhamento
efetivo , ou em prazo razovel, s propostas
da Ouvidoria, restando ao titular desse rgo,
como nico recurso, o exerccio do ius esperneandis.
portanto, indispensvel que se adote mecanismos
que tenham fora de persuaso junto aos dirigentes
universitrios, fazendo com que estes no se
furtem interlocuo com o Ouvidor.
Nesse
sentido, sugerimos a incorporao do Art. 24O,
inciso II, do Reglamento del Defensor de
la comunidad universitria da Universidade
de Valladolid (Espanha), que tem o seguinte
teor (traduo livre): no recebendo justificativa
satisfatria da omisso do dirigente, o Ouvidor
incluir o assunto no seu informe anual ao claustro
(Conselho universitrio) com a meno dos nomes
das autoridades que se omitirem.
Eis
o caso de um dispositivo que inibe mas no agride...
Dispositivo alis, que foi incorporado, por
sugesto nossa, Resoluo do CONSUNI da Universidade
Federal de Mato Grosso, que criou a ltima Ouvidoria
universitria instalada no pas.
Assim,
a omisso do dirigente de seu dever de prestar
informaes e esclarecimentos far parte, obrigatoriamente
do relatrio do Ouvidor ao CONSUNI (Art. 9o,
pargrafo 2 da Resoluo 09/2000).
Alm
dos mecanismos necessrios garantia de resposta,
a Resoluo da UFMT assegura tambm ao Ouvidor,
que esta seja dada em tempo hbil j que a
istrao Geral da UFMT ter prazo de trinta
dias, improrrogveis, para responder s propostas
apresentadas pelo(a) titular da Ouvidoria Geral
(Art. 10o da Resoluo 09/2000).
E no como na UFPB, onde este prazo pode ser
prorrogado por mais (30) trinta dias.
No
podemos esquecer que o Instituto da Ouvidoria
existe precisamente para tornar mais gil a
istrao. Condio sine qua non
para que o usurio, que a acionou, sinta que
valeu a pena faz-lo.
Outro
requisito essencial para a autonomia da Ouvidoria
diz respeito ao sigilo que deve ser assegurado
aos usurios do rgo, que possam, eventualmente,
sofrerem prejuzos se identificados pelo reclamado.
Note-se
que no se trata de anonimato pois o nome do
reclamante do conhecimento do Ouvidor, e poder
s-lo de outros dirigentes, se necessrio.
Aqui,
tambm, o regulamento da Ouvidoria da Universidade
de Valladolid ampara o reclamante ao estipular
que a informao... ter carter estritamente
confidencial, salvo quando o fato revestir carter
criminoso. (Art. 16o, inciso I do
Reglamento).
Na
verdade, no so apenas Ouvidorias estrangeiras
que garantem o direito do sigilo ao reclamante.
As Ouvidorias brasileiras de maior destaque
tambm o fazem. Entre estas, as dos municipios
de So Paulo e de Santo Andr (SP), a Ouvidoria
de Polcia do Estado de So Paulo e suas principais
congneres. Da mesma forma, a maioria das Ouvidorias
Universitrias que tm existncia disciplinada
em atos normativos, como a da Universidade Federal
de Juiz de fora, cujos dispositivos estabelecem
que dependendo da natureza do assunto, a critrio
do Ouvidor, ser garantido sigilo quanto ao
nome do demandante (Art. 7o, pargrafo
nico do Regimento Interno da Ouvidoria).
Na
Ouvidoria da UFPB, a norma vigente ite o
sigilo das reclamaes e denncias mas somente
at a finalizao do processo. O que torna,
na verdade, letra morta a garantia do sigilo
j que, em muitos casos, o denunciado poder
prejudicar o denunciante, mesmo aps o processo.
Outro
dispositivo que, na UFPB, compromete a autonomia
do Ouvidor consiste na forma de escolha do Ouvidor-Assistente.
Segundo
o Art. 10o da Resoluo
no 03/2001 do CONSUNI, o Ouvidor-Assistente
ser escolhido mediante lista trplice apresentada
pelo Ouvidor Geral ao CONSUNI. Esta lista trplice,
, na verdade, uma excrescncia. No existe,
de nosso conhecimento, em nenhuma Ouvidoria
do mundo. O Ouvidor Geral deve poder escolher
o seu Ouvidor-Assistente pois este, alm de
ser o seu auxiliar direto, pode partilhar algumas
das suas atribuies e bom que o faa.
Ademais,
nas condies presentes, praticamente impossvel
fazer o servidor aceitar compor uma lista trplice,
comprometendo-se previamente com a Ouvidoria
(em termos de programao de carga horria,
por exemplo), no estando certo de que ser
o escolhido. Sem falar que a inexistncia de
gratificao para a funo j no permite encontrar
algum que aceite ser indicado para o cargo
de Ouvidor-Assistente, mesmo sem a tal lista
trplice...
A
condio para a permanncia e para a garantia
da vitalidade da Ouvidoria, na UFPB como alhures,
a consolidao da autonomia desse rgo.
Por
essa razo, os Ouvidores universitrios brasileiros,
reunidos em Natal, subscreveram posicionamento
unnime no qual destacam que a relevante funo
de mediao e de agente indutor de inovaes
institucionais, para ser exercida em sua plenitude,
requer uma autonomia funcional que, alm da
garantia de mandato certo, assegure:
1.
resposta efetiva e pronta dos dirigentes universitrios
s interpelaes e recomendaes
formuladas pelos Ouvidores;
2.
nvel hierrquico e remunerao correspondente
de Pr-Reitor, compatvel com a abrangncia
das atribuies e dignidade das funes inerentes
ao instituto da Ouvidoria (no caso das universidades
pblicas, com expressa previso no plano de
cargos e salrios); e,
3.
garantia de sigilo aos usurios da Ouvidoria,
sempre quando seja indispensvel para a proteo
de seus direitos e legtimos interesses.