Gnese
dos
Direitos Humanos
Volume I
Joo
Baptista Herkenhoff
HISTRIA
DOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL 6o422q

8.
Os Direitos Humanos e a Constituio Imperial
A
Constituio Imperial (1824) foi outorgada, aps a dissoluo
da Constituinte. Essa dissoluo causou grande desaponto s
correntes liberais do pensamento poltico brasileiro.
O
movimento em prol da constitucionalizao do Brasil tivera
um momento decisivo no Rio de Janeiro. Foi quando o Senado da
Cmara apresentou veemente formulao perante o Prncipe
Regente D. Pedro I.
Atravs
de documento incisivo, a representao poltica do Rio
manifestava seu desagrado ante a circunstncia de serem as
Provncias de nosso pais regidas por leis elaboradas a
duas mil lguas de distncia, ou seja, em Portugal.
A
importncia dessa manifestao realada por Jos Honrio
Rodrigues na obra que escreveu sobre a Assemblia
Constituinte de I823.
A
Assemblia Constituinte de 1823 escreveu uma pgina
importante na Histria do Brasil.
Foi
fiel s grandes causas nacionais, segundo Jos Honrio
Rodrigues.
Revelou
prudncia e sabedoria. segundo Aurelino Leal.
Deve
ter um lugar de honra rios fastos das lutas libertrias da
sociedade brasileira, na opinio de Paulo Bonavides e Paes de
Andrade.
A
dissoluo da Assemblia Constituinte mereceu repdio de
muitos, no obstante a maioria tivesse se dobrado docilmente
vontade do poder dominante.
Na
repulsa ao ato de fora merece especial destaque a posio
de insubmisso assumida por Frei Caneca em Pernambuco. Tambm
houve protestos na Bahia, Cear. Paraba e Rio Grande do
Norte.
A
insatisfao em face do ato ditatorial de D. Pedro I, que
dissolveu a Constituinte, desembocou num movimento revolucionrio,
a Confederao do Equador.
No
obstante aparentemente derrotado, o ideal constitucionalista
jogou um peso importante no ulterior desenvolvimento da Histria
brasileira.
A
pregao constitucionalista encurralou D. Pedro. Mesmo
outorgando unia Constituio ao pas, no podia o monarca
ficar surdo s reivindicaes de liberdade que ecoaram na
Assemblia Constituinte de 1823.
Corno consequncia, a Constituio
imperial consagrou os principais Direitos Humanos, como ento
eram reconhecidos.
Foi uma Constituio liberal, no
reconhecimento de direito, no obstante autoritria. se
examinarmos a soma de poderes que se concentraram nas mos
do Imperador.
A Constituio Imperial
reconheceu, em principio, os direitos individuais, como ento
eram concebidos.
verdade que instituiu a
supremacia do homem-proprietrio. S este era ful-member
(isto , membro completo) do corpo social. Mas nisto fez coro
a Locke e ideologia liberal. Esta marcou sua profunda influncia
no processo da independncia e formao poltica do
Brasil.
A fora do pensamento liberal
burgus era to fone, no Brasil de ento, que se fazia
presente mesmo na vanguarda dos arraiais republicanos. O Critrio
de renda, por exemplo, como pr-requisto para o exerccio
dos direitos polticos, integrou o credo da Repblica
Rio-Grandense.
Podemos conferir essa informao
na obra que Victor Russomano escreveu a respeito da histria
constitucional do Rio Grande do Sul.
A Repblica Rio-Grandense (a
chamada Repblica de Piratini), foi um movimento separatista
que se ops Coroa Imperial.
Na esteira da Declarao dos
Direitos do Homem e do Cidado. decretada pela Assemblia
Nacional sa em 1789. a Constituio imperial
brasileira afirmou que a inviolabilidade dos direitos civis e
polticos tinha por base a liberdade, a segurana
individual e a propriedade (art. 179). Omitiu, contudo, o
quarto direito natural e imprescritvel, proclamado, ao lado
desses trs, pelo artigo segundo da Declarao francesa -
o direito de resistncia opresso.
Do constitucionalismo ingls a
Constituio imperial brasileira herdou a vedao da
destituio de magistrados peto rei (act of Settlement,
1701), o direito de petio. as imunidades parlamentares. a
proibio de penas cruis (Bill of Rights, 1689) e o
direito do homem a julgamento legal (Magna Carta, 1215).
Estabelecendo uma religio de
Estado, a Constituio imperial afastou-se da Carta sa
de 1789. Tambm no deu guarida ao art. 15 da Declarao
de 1789. Esse artigo estabelecia ter a sociedade o direito de
exigir que todo agente pblico prestasse contas de sua
istrao. Nenhuma determinao, nesse sentido, foi
includa na Constituio Imperial. Apenas o art. 5, 6,
mandava que, na morte do Imperador, ou vacncia do trono,
procedesse a Assemblia Geral o exame da inistrao
que acabara, para reformar os abusos nela introduzidos. A
Constituio consagrava a irresponsabilidade do Imperador,
mas poderia ter submetido os Ministros ao dever de prestar
contas aos representantes do povo, j que eram responsveis
por qualquer dissipao dos bens pblicos (art. 133, 6).
Desviando-se
dos documentos norte-americanos, coerente com a opo pela
forma monrquica de governo, a Constituio de 1824 evitou
a meno da idia
de estrita vinculao de todo governo ao consentimento dos
governados.
Atribuiu
excessivo peso poltico ao Imperador, fazendo-o detentor do
Poder Moderador.
A
inscrio de um Poder Moderador, na arquitetura do sistema
poltico. enfraqueceu os Partidos polticos, na opinio de
Afonso Arinos de MeIo Franco. Esse publicista comparou o Poder
Moderador a uma chave com a qual D. Pedro I abria qualquer
porta, inclusive as portas do Partido Liberal e do Partido
Conservador.
Tambm
na mesma linha de repdio ao autoritarismo imperial dirige-se
o julgamento de Paulo Bonavides e Paes de Andrade. Pensam
esses autores que a Constituio de 1824 tinha um potencial
de autoritarismo e responsabilidade concentrado na esfera de
arbtrio do Poder Moderador.
O
autoritarismo do Primeiro Reinado s cedeu aos avanos
democrticos do perodo da Regncia.
A
Regncia, na opinio de Joaquim Nabuco, foi uma grande poca
da vida nacional. Trouxe o fortalecimento do poder civil, em
oposio ao despotismo militar. Sagrou-se como numa fase de
integridade e despreendimento na vida pblica do pais.
Foi
um perodo fecundo de consolidao das liberdades
constitucionais,
Segundo Paulo Bonavides e Paes de
Andrade. Essas entraram na conscincia representativa
nacional de forma estvel e definitiva por todo o Seguindo
Reinado.
A Constituio de 25 de maro
de 1824 vigorou at 15 de novembro de 1889, ou seja, durante
mais de 65 anos.
9.
Principais franquias asseguradas pela
Constituio de 1824
As
principais franquias asseguradas pela Constituio de 1824
foram as seguintes:
-
liberdade de expresso do
pensamento, inclusive pela imprensa. independente de censura;
-
liberdade de convico religiosa e de culto privado,
contanto que fosse respeitada a religio do Estado;
-
inviolabilidade da casa;
-
proibio de priso sem culpa
formada. exceto nos casos declarados em lei, exigindo-se,
contudo, nesta ltima hiptese, nota de culpa assinada pelo
juiz;
-
exigncia de ordem escrita da
autoridade legitima para a execuo da priso, exceto
flagrante delito;
-
punio da autoridade que
ordenasse priso arbitrria, bem como de quem a tivesse
requerido;
-
exigncia de lei anterior e
autoridade competente, para sentenciar algum;
-
independncia do poder
judicial;
-
igualdade de todos perante a
lei;
-
o de todos os cidados aos
cargos pblicos;
-
proibio de foro
privilegiado;
-
abolio dos aoites,
tortura, marca de ferro quente e todas as demais penas cruis;
-
proibio de ar a pena da
pessoa do delinquente e, em consequncia, proibio do
confisco de bens e da transmisso da infmia a parentes;
-
garantia de cadeias limpas e bem
arejadas, havendo diversas casas para a separao dos rus,
conforme suas circunstncias e natureza de seus crimes;
-
direito de propriedade;
-
liberdade de trabalho;
-
inviolabilidade do segredo das
cartas;
-
direito de petio e de
queixa, inclusive o de promover a responsabilidade dos
infratores da Constituio;
-
instruo primria gratuita.
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