Projeto DHnet
Ponto de Cultura
Podcasts
Direitos Humanos
Desejos Humanos
Educao EDH
Cibercidadania
Memria Histrica
Arte e Cultura
Central de Denncias
Banco de Dados
MNDH Brasil
ONGs Direitos Humanos
ABC Militantes DH
Rede Mercosul
Rede Brasil DH
Redes Estaduais
Rede Estadual RN
Mundo Comisses
Brasil Nunca Mais
Brasil Comisses
Estados Comisses
Comits Verdade BR
Comit Verdade RN
Rede Lusfona
Rede Cabo Verde
Rede Guin-Bissau
Rede Moambique

1g2312

OS JOVENS E A RESPONSABILIDADE PENAL

(Do Livro Violncia o Brasil cruel e sem maquiagem, Ed. Moderna, 1994, pg. 50-54)

HLIO BICUDO

Nesse quadro, tenciona-se fixar em 14 ou 16 anos a idade mnima de responsabilidade penal, que hoje comea aos 18 asnos de idade.

Alega-se que a constituio j atribui o voto facultativo aos jovens de 16 anos e pretende-se considerar a mesma idade para a direo de veculos automotores.

Portanto, seria pelo menos discutvel a hiptese de se rebaixar a idade de responsabilidade penal.

A primeira tentativa para concretiz-la ocorreu durante a ditadura militar, quando os menores de 16 anos foram considerados sujeitos ativos nos chamados "delitos contra a segurana nacional" (Lei 6.620, de 17 de dezembro de 1978.

A idia ficou no ar e reapareceu pelas mos daqueles que vem na pena to-somente uma forma de excluso social.

Se os meninos que lutam nas ruas, como um fator de seleo natural, transformaram aqueles que nunca brincaram em elementos potencialmente perigosos para a manuteno das regras estabelecidas de convivncia sociais, no h por que, argumentam, consider-los penalmente inimputveis.

Esquecem-se, em suas consideraes, do descaso dos rgos estatais responsveis pela aplicao da poltica, definida legalmente, de atendimento criana e ao jovem infrator.

Em vez de defenderem uma atuao que proteja a criana ou o adolescente jogadas marginalidade por uma ordem social injusta, enfatizam a necessidade de uma represso sem limites.

Nestas condies, a Febem, em lugar de promoverem o "bem-estar do menor", funcionam como rgos de conteno, onde prevalecem os maus-tratos e o desconhecimento dos direitos elencados no estatuto da Criana e do adolescente.

Se o jovem de 16 anos j vota e logo dirigir veculos automotores, conclui-se que ele no deve escapar da responsabilidade penal.

Isso totalmente falso.

Argumenta-se: ao escolher os dirigentes da Repblica, dos estados e dos municpios, o menor sujeita-se a todas as regras insertas na legislao eleitoral, inclusive as de natureza penal.

Ou, dirigindo um carro, ele pode envolver-se em acidentes, que danifiquem o patrimnio e a integridade fsica ou a vida de terceiros.

Ento, por que no consider-lo sujeito ativo para os efeitos penais?

Ora, tanto o voto facultativo como a conduo de automveis so direitos que se outorgam aos jovens das classe mais favorecidas.

Conforme observa Dom Luciano Mendes de Almeida, presidente da CNBB (Conferncia Nacional dos Bispos do brasil), na luta diria pela sobrevivncia, uma menina ou um menino de rua no esto interessados em qualificar-se como eleitor e votar.

E muito menos tero o a uma carteira de motorista, para exercer uma profisso no contexto do transporte de pessoas ou de mercadorias.

Esses jovens vem a vida, com a qual no contam, de outro prisma. No conhecem a solidariedade, o amor ou o aconchego da famlia.

E mais: as faculdades concedidas aos jovens dos estratos superiores da sociedade transformam-se numa verdadeira armadilha para os demais jovens, a grande maioria. As discriminaes j existentes contra as meninas e meninos de rua tendem a agravar-se ainda mais.

Os jovens infratores das famlias ricas conseguem escapar facilmente das malhas policiais ou dos procedimentos judiciais.

Entretanto, os meninos e meninas de rua continuaro a ser penalizados, no porque desejamos abrir-lhes possibilidades de integrao comunidade, mas simplesmente porque no queremos v-los nas ruas, desejamos afast-los do nosso convvio.

Alm disso, falar em responsabilidade criminal aos 14 ou 16 anos eqivale a ignorar a realidade brasileira.

Segundo dados do IBGE (Fundao do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica), em 1990 tnhamos 60 milhes de crianas e adolescentes, dos quais 32 milhes (53,5%) viviam em famlias cuja renda per capita no ultraava meio salrio mnimo. Aproximadamente 4 milhes de crianas em idade escolar no freqentavam a escola, e 18 milhes de pessoas com mais de 15 anos eram analfabetas.

Esses indicadores, por si s perversos, ainda no evidenciam os problemas das crianas de rua, que se avolumam nas grandes cidades, e os dos jovens infratores que, apesar de numericamente insignificantes, assumem propores alarmantes nas rebelies no sistema de conteno.

A falncia das polticas sociais pblicas necessrias ao atendimento da populao na faixa etria at 18 anos um dado da realidade, expresso nos ndices de mortalidade infantil, de evaso escolar, de desnutrio, fome e misria.

Pesquisa desenvolvida pela professora Myriam Mesquita Pugliese de Castro, do Ncleo de Estudos sobre a a Violncia da USP, revelou um cenrio contristador. De acordo com os registros do IML-SP, em 1990 ocorreram, na capital paulista, 994 homicdios de crianas e jovens, sobretudo na faixa etria de 15-17 anos uma mdia de 2,7 assassinatos/dia. Esse tipo de quadro tambm demonstra a intencionalidade de matar por parte dos agentes agressores (10,9% identificados como policiais, segundo apurou a mesma pesquisa) e a exacerbao da violncia (criana no Rio de Janeiro morta com 38 tiros na cabea, conforme divulgou a imprensa carioca).

Enfim, estamos diante da banalizao da morte. E tudo decorrncia da no-adoo de uma poltica social voltada para a erradicao da violncia pelo tratamento adequado de suas causas (injustias sociais, misria) e vtimas.

No lugar da erradicao da violncia pela violncia, preciso exigir a erradicao da violncia pela construo da cidadania.

E isso implica, sobretudo alimentar, educar, dar o a recursos mdios e prover os pais de salrios dignos, que viabilizem a moradia sem promiscuidade e impeam o abandono das crianas.

------------------

(Hlio Bicudo, 77, jornalista e advogado, presidente do Centro Santo Dias de Direitos Humanos e membro da Comisso Interamericana de Direitos Humanos)

Desde 1995 dhnet-br.diariodetocantins.com Copyleft - Telefones: 055 84 3211.5428 e 9977.8702 WhatsApp
Skype:direitoshumanos Email: [email protected] Facebook: DHnetDh
Busca DHnet Google
Not
Loja DHnet
DHnet 18 anos - 1995-2013
Linha do Tempo
Sistemas Internacionais de Direitos Humanos
Sistema Nacional de Direitos Humanos
Sistemas Estaduais de Direitos Humanos
Sistemas Municipais de Direitos Humanos
Hist
MNDH
Militantes Brasileiros de Direitos Humanos
Projeto Brasil Nunca Mais
Direito a Mem
Banco de Dados  Base de Dados Direitos Humanos
Tecido Cultural Ponto de Cultura Rio Grande do Norte
1935 Multim