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3r5g18

Reforma do Sistema interamericano

Traduo : Adriana Carneiro Monteiro

Uma viso no governamental do processo de reforma
do sistema interamericano

Ariel E. Dulitzky


Viviana Krsticevic


Alejandro Valencia Villa

I. Avaliao dos motivos do processo e a direo da reavaliao do sistema

II. Anlise de algumas das propostas em discusso.

A. A relao entre a Comisso e a Corte.

B. Transparncia do Sistema: issibilidade e durao do procedimento.

C. A confidencialidade e o uso da imprensa.

D. A doutrina de pertinncia

E. Sobre o vnculo operativo com as autoridades judiciais nacionais

F. Autonomia funcional do sistema

G. O valor das recomendaes

III. Concluses

I. Avaliao dos motivos do processo e a direo da reavaliao do sistema

O sistema interamericano de proteo dos Direitos Humanos, formado pela Comisso Interamericana de Direitos Humanos (a Comisso) e a Corte Interamericana de Direitos Humanos (a Corte), se encontra atualmente em um processo de redefinio de seu papel.

Em seus cinqenta anos de funcionamento, tem evoludo em um processo de juridicizao e efetividade dos mecanismos de proteo. Durante esse perodo, tem tido numerosos sucessos na promoo, exerccio e defesa dos direitos humanos da regio. Desempenhou papel de grande importncia quando predominaram regimes autoritrios, identificando e denunciando as graves e sistemticas violaes que ocorriam. Suas aes contriburam para a abertura de espaos na sociedade civil e criaram um ciclo propcio para o regresso da plena vigncia das liberdades pblicas.

Com o advento de governos eleitos democraticamente, a situao dos direitos humanos na Amrica Latina melhorou consideravelmente. Todavia, as violaes dos mesmos continuam. Ainda quando a maioria dos pases no tem polticos planejados pelo aparelho do Estado contra violaes graves, a omisso na investigao e castigo de execues, torturas e outras violaes responsabilizam o Estado internacionalmente. A impunidade continua sendo uma constante na nossa regio nos anos noventa. Paralelamente, muitos Estados esto empenhados na melhoria da situao dos direitos humanos a nvel domstico, impulsionando reformas legislativas, promovendo campanhas educativas, capacitando os membros da Fora Pblica, entre outros. Essa situao impe novos desafios, discusses e preocupaes, tanto para os Estados e para os defensores dos Direitos Humanos, como para os rgos de superviso internacional.

Todavia, essas compensaes favorveis situao de direitos humanos no continente no se refletiam de maneira imediata nos rgos do sistema interamericano. No final da dcada de oitenta e nos primeiros anos da dcada de 90, a Comisso no se caracterizou por ter uma atitude de acordo com os novos tempos que se viviam. A Comisso expediu durante esse perodo algumas decises e relatrios sobre a situao de direitos humanos que resultaram sumamente valiosas; todavia, a razo jurdica da maioria das decises no foi consistente com as decises anteriores, nem suficientemente elaborada, nem tampouco o foram algumas das prticas processuais da Comisso. ( ) A gama de direitos examinados pela Comisso aumentou, mas o nmero de casos resultantes decresceu abruptamente nos ltimos anos, ainda existindo centenas de casos na dependncia de uma resoluo final. Essa atitude da Comisso se traduziu na falta de resposta em muitos dos casos apresentados, com a conseqente recusa de justia. Todavia, diferena da prtica tradicional da Comisso durante os anos oitenta, a mesma remeteu numerosos casos Corte . Durante o perodo em anlise (entre o princpio da dcada e 1995), a Comisso se caracterizou por certa inconsistncia nos critrios e por um perfil inferior, devido parcialmente falta de juridicizao das prticas da mesma, desorganizao istrativa, delegao de decises bsicas do processo Secretaria da Comisso e incapacidade de adequao s novas condies polticas e de ao.

Entre 1995 e 1996, dois acontecimentos tiveram um forte impacto no desenvolvimento do sistema: a troca de Secretrio Executivo da Comisso e a nova composio da Comisso. Em princpios de 1996, o Dr. Taiana assumiu suas novas funes como Secretrio Executivo. Entretanto, a composio da Comisso foi trocada com a renovao parcial de seus membros em Janeiro de 1996.

Os membros da Comisso assumiram uma posio ativa no trato dos assuntos polticos e istrativos do processamento de casos e de elaborao de relatrios. Uma das principais preocupaes da Comisso foi a de revisar as prticas processuais da Secretaria Executiva, num esforo de estabelecer critrios transparentes e eficientes de funcionamento do sistema interamericano, em particular em relao aos casos individuais. Essa nova prtica se evidencia nas ltimas sesses, onde se apresentam avanos significativos em matrias como relatrios de isso de casos individuais, parmetros para impulsionar solues amistosas, critrios para a elaborao de relatrios sobre pases, entre outros.

A avaliao do trabalho da Corte nos ltimos anos resulta ainda mais despretensiosa pelo nmero delimitado de decises que ela tem tomado. Por um lado, a Corte tem fortalecido a defesa dos direitos humanos atravs de sua jurisprudncia (especialmente em seus primeiros anos de funcionamento), na qual tem realizado uma contribuio especial s opinies consultivas emanadas da mesma que supriram a falta de referncia de casos Corte pela Comisso durante um largo perodo, assim como na importante deciso dos casos hondurenhos. Em particular, a interpretao de alguns dos direitos consagrados pela Conveno se tem visto enriquecida por opinies consultivas. Por outro, o pequeno nmero de casos contenciosos que tem tido oportunidade de examinar (-), no representativo quanto ao nmero de casos tramitados pela Comisso e ao nmero de violaes de direitos humanos que se apresentam no continente, como quanto prpria representatividade dos direitos examinados. A Corte, em sua atual composio, tem elaborado uma valiosa jurisprudncia em matrias de medidas de preveno e reparao. Porm, de acordo com a perspectiva de numerosos juristas, a Corte no tem se dedicado a um consistente desenvolvimento essencial dos direitos, com o resultado de que a razo jurdica nas ltimas decises da Corte menos elaborada que nos seus primeiros anos. bem verdade que os Estados estavam desacostumados a receber demandas internacionais ante a Corte, e a ver a Comisso no papel de defensora das vtimas que lhe concede a Conveno; dessa forma, como produto de uma prtica exclusiva da Comisso de enviar casos Corte, os atritos entre ela e os Estados aumentaram.

Esses novos desafios e realidades tm gerado atitudes diferentes por parte dos Estados. Alguns tm respondido procurando que este renovado sistema interamericano se converta em um aliado soluo de muitos de seus problemas relacionados com a situao de direitos humanos. Esses Estados (entre eles, destacando-se a Repblica da Argentina), tm-se caracterizado por uma atitude cooperante com o sistema, tanto a nvel da Comisso como da Corte, utilizando-o como um meio para detectar algumas violaes de direitos fundamentais cometidos tanto pela esfera executiva, como pela legislativa e judicial de seus pases, impulsionando, dessa maneira, trocas nas polticas ou leis internas dirigidas a superar as situaes violatrias Conveno Americana de Direitos Humanos (a Conveno), e remediando violaes em casos individuais. Outros Estados com graves problemas de direitos humanos, como Colmbia, tm-se comprometido ativamente nas solues amistosas realizadas com o auspcio da Comisso.

Outros Estados, ao contrrio, em resposta evidente vontade da Comisso de trabalhar mais eficientemente para a proteo dos direitos na regio - em particular aqueles que se viram mais afetados - adotaram uma postura defensiva. A resposta foi propor reavaliar e modificar o funcionamento do sistema. O maior impulsionador das mudanas o Peru, que tem pendentes mais de 150 casos perante a Comisso e 4 perante a Corte.

(-).

Em Junho de 1996, a Assemblia Geral da Organizao dos Estados Americanos (OEA) aprovou uma resoluo encomendando ao Conselho Permanente a realizao de uma avaliao do funcionamento do sistema com vistas a um processo que permita seu aperfeioamento, includa a possibilidade de reformar os instrumentos jurdicos correspondentes, assim como os mtodos e procedimentos de trabalho. Desse modo, resolveu promover um dilogo entre os Estados membros e entre estes, a Comisso e a Corte, assim como com especialistas, com vistas a contribuir para essa tarefa.

Como parte do processo, o secretrio Geral do OEA, Csar Gaviria Trujillo e a Comisso, de 2 a 4 de Dezembro de 1996, convocaram um seminrio sobre O sistema interamericano de promoo e proteo dos direitos humanos, em que participaram representantes dos Estados do hemisfrio, especialistas e algumas organizaes no governamentais.

O processo de reavaliao do sistema interamericano tem gerado duas posies opostas. Uma, de questionamento por parte de alguns dos Estados-membros da OEA. Pases como Peru, Mxico e Chile tm proposto iniciativas que, se aprovadas, debilitariam especialmente o trabalho do sistema interamericano. Entre as propostas que vm impulsionando esses pases, encontram-se a de estabelecer regras restritivas na issibilidade das peties e na legitimidade processual, limitar a produo de relatrios gerais e especiais tanto sobre casos concretos como sobre as situaes de direitos humanos em alguns pases, determinar que o procedimento e os relatrios da Comisso sejam estritamente confidenciais e aprimorar o controle poltico sobre os rgos do sistema. A outra posio, representada por alguns governos, pelos defensores de direitos humanos, pelas organizaes no-governamentais, pelas vtimas e seus familiares, defende a consolidao, juridicizao e maior efetividade do sistema interamericano.

O processo de avaliao do sistema pode ter aspectos sumamente positivos que permitam a avaliao das prticas e a sugesto de modificaes necessrias no sistema. Especialmente se a discusso se d no quadro de um debate que no se restrinja aos Estados; seno que inclua especialistas, os membros dos rgos que os compem, organizaes no governamentais, etc. Nesse sentido, interessante analisar as concluses e recomendaes do seminrio organizado pela Comisso em Dezembro de 1996.

Os Estados tm o poder de decidir o que fazer, porm no devem esquecer que so os indivduos os beneficirios do sistema e que so os Homens de carne e osso que compem as naes do continente.

nesse contexto que o Secretrio Geral preparou um documento intitulado Em direo a uma nova viso do Sistema Interamericano de Direitos Humanos a fim de enriquecer o processo de debate; algumas propostas desse documento sero comentadas a seguir. O documento foi distribudo s comisses permanentes e foi apresentado ao Conselho Permanente da Organizao. O Dr. Gaviria se referiu a aspectos centrais do mesmo no seminrio de dezembro.

II. Anlise de algumas das propostas em discusso.

No processo que temos descrito se tm esboado mltiplas propostas em relao ao procedimento diante da Comisso e da Corte e o papel que deveriam cumprir ambos os rgos. Muitas delas teriam especial transcendncia para o futuro do sistema com efeitos sumamente nocivos para os habitantes de nosso continente. Por exemplo, se tem proposto limitar o papel da Comisso a um simples rgo de promoo dos direitos humanos sem praticamente nenhuma funo de tramitao de casos individuais, ou reduzir de diferentes maneiras o o das organizaes no-governamentais de direitos humanos Comisso.

Sem prejuzo de deixar firmada nossa posio contrria a ambas por levar a um sistema menos eficiente para a tutela dos direitos humanos, nas prximas sees analisaremos apenas algumas propostas que aparecem de uma ou outra maneira compiladas no documento elaborado pelo Secretrio Geral da OEA.

A. A relao entre a Comisso e a Corte.

Uma das propostas mais interessantes que est em debate a de transformar a relao de trabalho entre a Comisso e a Corte, a fim de realizar mais eficientemente o trabalho dos rgos com o objetivo de garantir o princpio de igualdade das partes e a integridade do sistema de proteo dos direitos humanos. Nesse sentido, e seguindo a mais avanada doutrina no tema, O Secretrio Geral e alguns governos concordam com a importncia de evitar que a Corte duplique as tarefas de determinao das aes que realiza a Comisso. Isto , distribuir de maneira razovel as funes de investigao entre ambos os organismos em reas de uma economia processual que evite a duplicao de certas atividades. Uma alternativa plausvel a proposta do Secretrio Geral de conceder de maneira fundamental a tarefa da determinao das aes Comisso, com o objetivo de que, somente de maneira excepcional, a Corte volte a trat-las quando sejam aes supervenientes e relevantes.

Outro tema que corresponde imparcialidade da Comisso o papel que cumpre diante da Corte. Na atualidade, a Comisso atua na qualidade de parte, como defensora das vtimas diante da Corte. Esse papel gera a aparncia de parcialidade, j que h uma agem de juiz das partes - vtimas e Estados - na tramitao diante dela a advogado das vtimas e adversrio do Estado na tramitao diante da Corte. A Comisso deve atuar em um quadro que lhe permita garantir a realidade assim como a aparncia de imparcialidade maneira de um Ministrio Pblico a nvel local em interesse da integridade do sistema de proteo. Em contrapartida, tambm concordamos com a importncia da representao independente e direta dos peticionrios diante da Corte, como recomenda o documento do Secretrio Geral.

Um tema adicional que se vincula aparncia de imparcialidade a faculdade da Comisso de enviar casos Corte. Com vistas a eliminar a falta de imparcialidade, dever-se-ia estabelecer a possibilidade de que os peticionrios tenham a legitimidade para submeter um caso Corte - maneira do Protocolo no 9 Conveno Europia de Direitos Humanos - ou a Comisso deveria avaliar com especial ateno a solicitao dos peticionrios de que um caso seja enviado ou no Corte.

B. Transparncia do Sistema: issibilidade e durao do procedimento.

Uma matria na qual o sistema ganharia muito em qualidade fixar com exatido os critrios e a tramitao dos casos diante da Comisso Interamericana, tal como acertadamente assinala o documento do Dr. Gaviria. O tema da isso e durao do procedimento deve estabelecer-se de acordo com regras flexveis, porm razoveis, que estabeleam prazos certos para a tomada de determinaes. Tanto os Estados como os peticionrios necessitam garantir um sistema que no permita que a tomada de certas decises se atribua a causas polticas ou arbitrariedades. Se a determinao do nmero de relatrios no depende da maturidade dos casos nem do prazo transcorrido, seno da vontade e esforo de um relator ou advogado da Secretaria, os Estados e peticionrios certamente podem atribui-lo a razes que no necessariamente sejam adequadas. Os recursos econmicos e humanos da Secretria da Comisso que permitam a contratao de pessoal especialista e o pagamento de salrios para a gradual elevao da funo de membro da Comisso a tempo integral, constituem uma condio necessria para que a mesma responda eficientemente s exigncias dos Estados, especialistas e representantes das vtimas.

Um sistema transparente de issibilidade deveria estabelecer alguns pontos essenciais. Entre os reunidos na proposta do Secretrio Geral esto os seguintes: Primeiro, contar com um registro imediato da toda comunicao recebida com a respectiva notificao de recepo imediata aos peticionrios. Segundo, dar notificao imediata aos governos sobre qualquer comunicao que lhes diga respeito a fim de lhes permitir atuar nessa situao ou caso; tudo isso entendendo-se que o registro das comunicaes e a notificao ao governo no implica que exista um caso contra o Estado, do que deveria desejar-se firmeza na nota inicial. Terceiro, contestar as faculdades da Secretaria Executiva de rechaar prima facie as solicitaes sem dar ao governo a possibilidade de solucionar seus prprios assuntos, ainda quando a Secretaria no tenha faculdades para declarar a inissibilidade de um caso. Quarto, promover o estabelecimento de um procedimento de reconsiderao das decises de inissibilidade por parte da Comisso, seguindo o modelo do Comit de Direitos Humanos das Naes Unidas. Quinto, estabelecer um sistema especial de registro e tramitao das peties de medidas cautelares por seu carter urgente. Sexto, o cumprimento dos prazos estabelecidos nos Regulamentos.

C. A confidencialidade e o uso da imprensa.

Alguns Estados esto seriamente preocupados em relao ao que consideram um uso prejudicial da imprensa por parte de alguns dos usurios do sistema. Sustentam que muitas vezes seus governos so condenados pela imprensa em virtude da apresentao de um nico caso Comisso Interamericana. Frente a isso, existe uma importante funo da imprensa de manter informada a opinio pblica. A difuso do trabalho da Comisso e da Corte cumpre um papel fundamental na promoo dos direitos humanos no hemisfrio e contribui para a transparncia do sistema. As notcias da imprensa no vo cessar com estabelecimento de regras de confidncia sobre o procedimento, j que as vtimas vo continuar gozando da liberdade de informar opinio pblica sobre as denncias submetidas ao rgo internacional em virtude das regras estabelecidas no prprio tratado para proteger a liberdade de expresso. Porm, as regras de confidncia podem limitar a transparncia do processo.

Frente a essas tendncias contrapostas, a alternativa de criar um Secretrio de Imprensa da Comisso, tal como prope o Secretrio Geral, contribuiria enormemente para superar esses problemas. Essa iniciativa permitiria a emisso de comunicados imprensa e a consulta para confirmar informao oferecida pelos peticionrios ou pelos Estados. Assim se alcanaria um equilbrio razovel de interesses a respeito de informao fugaz ou mal intencionada. Outra alternativa para esclarecer as prticas seria a Comisso imitar o procedimento da Corte Internacional e de seu par europeu de emitir comunicado imprensa cada vez que adota uma deciso, informando o contedo da mesma.

D. A doutrina de pertinncia

O propsito dos sistemas de proteo salvaguardar os direitos bsicos de cada indivduo em virtude de sua dignidade e, em segundo lugar, alguns dos mecanismos foram dessa forma pensados no sentido de que atuariam como sistemas anteriores de alerta para evitar as violaes graves e nocivas que ocorreram na Europa na Segunda Guerra Mundial e que sensibilizaram a comunidade internacional a fim de criar um sistema de proteo internacional.

Levando em conta o propsito e a histria dos mecanismos internacionais de proteo dos direitos humanos, no compartilhamos com o Secretrio Geral sua proposta de estabelecer um mecanismo que permita eliminar casos em sua etapa de isso em virtude de um critrio discricionrio. O documento sustenta que necessrio que haja mais que uma violao aos direitos protegidos e que os recursos judiciais a nvel interno fracassem para que se possa iniciar um caso. Sugere-se que se estabelea uma doutrina da pertinncia a fim de deixar de lado casos que no devam ser objeto de uma deciso judicial. muito provvel que o carter discricionrio da faculdade politizaria o papel da Comisso nesta etapa inicial. Nem todos os Estados estariam sujeitos s mesmas regras, j que aqueles Estados com maior influncia poltica poderiam evitar que se discutissem certos casos sensveis politicamente. Por outro lado, nem todas as vtimas teriam direito garantia de seus direitos. razovel sustentar que o sistema interamericano no pode nem deve processar todas as denncias que recebe, como de fato rechaa um nmero considervel de denncias. Porm a soluo ao trmite de casos definir com clareza as pautas de issibilidade, publicando todas as decises que a Comisso adote nesta matria.

Alguns Estados tm delineado uma doutrina da discricionariedade, que consistiria na seleo de casos exemplares a fim de estabelecer precedentes interamericanos ao modo de uma Corte Suprema Interamericana. Algumas Cortes Supremas tm o poder discricionrio de atuar apenas naqueles pontos sobre os quais haja uma jurisprudncia clara ou consistente dos tribunais inferiores. Isso razovel em sistemas que estabelecem vrios instncias para a garantia judicial de direitos, e quando a deciso da Corte Suprema obriga os tribunais inferiores. No caso do Sistema Interamericano, a Comisso e a Corte constituem a ltima e muitas vezes nica segurana de justia. Em resumo, um erro tcnico e poltico assemelhar o sistema internacional de proteo a uma Corte Suprema, ou fazer da proteo internacional uma faculdade discricionria, o que iria contra o objetivo e propsito do sistema interamericano e contribuiria para a deteriorao de sua funo.

E. Sobre o vnculo operativo com as autoridades judiciais nacionais

A relao e, em especial, o envolvimento dos ombudsman, rgos fiscalizadores e defensores no sistema interamericano, propostos pelo Dr. Gaviria, tm a capacidade de enriquecer o sistema de proteo dos direitos humanos.

Com o objetivo de aproveitar a experincia e conhecimento das realidades nacionais e contatos com os distintos atores envolvidos nos casos dos ombudsman, poderiam ser contempladas as seguintes possibilidades de sua participao no sistema interamericano: primeiro, solicitao em determinados casos de uso de algumas provas que a Comisso lhe pea ou que contribua com meios probatrios que possam faz-lo; segundo, solicitao de produo de opinies em Direito sobre determinados pontos requeridos pela Comisso; terceiro, incorporao de alguns dos procedimentos de soluo amistosa; quarto, possvel considerar a possibilidade de a Comisso fornecer notificao de uma petio inicial simultaneamente autoridade competente (Embaixada, Ministrio das Relaes Exteriores, etc.) e ao respectivo ombudsman para que formule as observaes ou contribua com a informao que estime conveniente.

Porm, acreditamos que violaria as regras bsicas do processo estabelecer procedimentos desiguais baseados exclusivamente na qualidade do peticionrio, tal como prope seu documento.

A rapidez no procedimento deve depender da gravidade e urgncia do caso e da prova aduzida, no de quem o apresenta.

F. Autonomia funcional do sistema

Tambm compartilhamos quase todas as sugestes relacionadas com o fortalecimento da istrao do sistema (entre outras, que a Comisso deveria eleger seu Secretrio Executivo e seu pessoal e controlar seu oramento), que aparecem no documento do Secretrio Geral. A autonomia istrativa do sistema, sem dvida, por imprimir uma maior eficincia e celeridade em suas funes.

A capacidade da Secretaria da Comisso de investir maiores recursos na contratao de pessoal especializado e no pagamento de salrios para a gradual elevao da funo de membro da Comisso a tempo integral uma condio necessria para que a mesma responda eficientemente s exigncias dos Estados, especialistas e representantes das vtimas.

G. O valor das recomendaes

A adoo da legislao nacional necessria para garantir o cumprimento das decises do sistema interamericano no deve circunscrever-se apenas s sentenas da Corte, como sugere o documento do Secretrio Geral. Nossa posio a de que as recomendaes da Comisso so obrigatrias e no meramente posies morais sem nenhum valor.

importante que os Estados adotem modelos similares aos seguidos pela Colmbia (legislao que estabelece o procedimento de execuo das recomendaes relativas a indenizaes) ou o projeto de lei argentino (faz-se obrigatrio o cumprimento de todas as recomendaes e, se o Governo no estiver de acordo, deve enviar o caso Corte)

III. Concluso

O sistema interamericano tem demostrado ser sumamente til como instrumento para defesa e promoo dos direitos humanos. Porm, a Comisso e a Corte ainda no tm desenvolvido todas as potencialidades que a Conveno Americana sobre Direitos Humanos lhes confere; e tm sido alvos de merecidas e no merecidas crticas pelos distintos atores do sistema interamericano.

O processo de avaliao do mecanismo regional de proteo deve servir para identificar aquelas reas em que seja necessrio esclarecer critrios e procedimentos, assim como propor as reformas necessrias, tendo em conta a experincia comparada luz das realidades do nosso continente e sem perder de vista que o propsito da discusso deve ser o fortalecimento do mecanismo de proteo dos direitos humanos. Neste processo, essencial que se garanta a ampla participao de especialistas na rea de direitos humanos, dos membros dos rgos do sistema, dos Estados, das organizaes no governamentais e dos defensores das vtimas.

Os valores de conduo do processo de reforma devem ser a celeridade, a transparncia, a igualdade entre as partes, a segurana jurdica, a despolitizao e a eficcia do procedimento diante da Comisso e da Corte. Isso deve complementar-se com a condio necessria para que essas garantias sejam efetivas, isto , dotar ambos os rgos de recursos econmicos e humanos suficientes para que possam desempenhar a contento suas funes.

Porm, a eficcia da reforma necessita mais do que de rgos de proteo; requer, do mesmo modo, vontade poltica dos Estados de cumprir as obrigaes assumidas na Conveno, modificando a legislao e as prticas a nvel local quando seja necessrio e, certamente, cumprindo as recomendaes e sentenas dos rgos do sistema.

Para desenvolver esse processo de dilogo e aperfeioamento, no necessrio reformar os instrumentos convencionais do sistema interamericano. Basta a discusso ampla, enriquecedora e de boa f dos mltiplos atores do mesmo, que posteriormente se refletir em modificaes de normas regulamentares ou estatutrias, em contribuies econmicas, em vontade e apoio poltico a um sistema regional de proteo dos direitos humanos bsicos.

1. Disso do conta o relatrio elaborado pela Associao de Advogados de Nova York, os sucessivos relatrios anuais do Internacional Human Rights Group, o Relatrio Anual de 1995 do Human Rights Watch, etc.

2. Cabe recordar que somente os Estados ou a Comisso tm a capacidade de submeter casos Corte segundo o estabelecido no art. 61.1 da Conveno.

3. Os casos se referem, em sua maioria, a violaes ao direito vida ou violaes graves s garantias do processo devido. Entre eles, a demolio intencional de uma priso a fim de conter um motim, causando a morte de mais de uma centena de processados. Corte IDH, Caso Neira Alegria e outros, Peru.

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