4ck6y
Corrupo
e Poder
Luiz Francisco de Souza p664g
Procurador
da Repblica
Num
pas onde as desigualdades sociais so gritantes e o Estado
controlado pelo grande capital, o combate corrupo somente
produzir efeitos se houver uma transformao profunda na estrutura
do poder
O Brasil um
pas infectado de corrupo, de devastao ambiental, de
desigualdade, de explorao dos trabalhadores e das mulheres. Um pas
onde 22 mil latifundirios e alguns milhares de grandes capitalistas
paralisam o proletariado. Exploram os trabalhadores nas unidades de
produo. Exploram-nos como consumidores, usando o controle sobre o
mercado via trustes e cartis. Exploram e destroem a natureza, agindo
como devastadores ambientais. E, claro, corrompem o Estado, usando
executivos infiltrados, valendo-se do financiamento privado das
campanhas, do nepotismo e do controle da grande mdia para semear
mentiras. Ou comprando as conscincias de agentes pblicos,
aproveitando-se do congelamento salarial que atinge o funcionalismo h
sete anos e da precarizao das relaes jurdicas dos
trabalhadores.
Um Brasil menos
corrupto teria que ser um pas sem latifndios e sem o grande capital
privado. Seria uma republica calcada num tipo de socialismo humanista,
democrtico, e no distributivismo que o velho Alceu Amoroso Lima, Frei
Betto e outros sempre defenderam. Uma repblica com milhes de
camponeses cooperatizados, de pequenas e medias cidades, com milhes de
pequenos e mdios produtores, sem ricos, sem milionrios. Onde OS
grandes meios de produo seriam organizados de forma cooperativa, e
onde todo o processo produtivo seria calcado na co-gesto, na autogesto
e no planejamento democrtico, participativo. Com um Estado democrtico
que controle e planifique o uso dos bens de produo, exigindo a
finalidade social intrnseca a qualquer propriedade, graas a um
forte contexto jurdico. No fundo, o mesmo sonho de Barbosa Lima
Sobrinho, de Alceu Amoroso Lima e de inmeros telogos da libertao
e bispos. Um pas sem latifndios, sem multinacionais, sem o pagamento
de dvidas pblicas j pagas dezenas de vezes, sem usura, sem especulao
e sem o grande capital privado, porque este cria tamanho poder que
permite a corrupo do Estado, controla-o para facilitar negociatas,
concentrar o capital e explorar os trabalhadores.
Cada vez pior 63445d
A corrupo est
cada vez pior e epidmica. Isso ocorre por varias causas. Vejamos
algumas. Primeira: a complacncia e lenincia do governo (basta
considerar a relao de medidas preventivas que poderiam ser
adotadas e no o so). Segunda: a falta de legislao para reprimir
a corrupo, pois algumas normas tm mais de 60 anos e so
totalmente insuficientes. Terceira: o desmonte, patrocinado pelo governo
(que tenta ampliar a destruio), de instituies de combate
corrupo (MPF, Polcia Federal, Secretaria da Receita Federal,
Secretaria Federal de Controle Interno, TCU, Fiscalizao do Bacen,
AGU, CADE, Fiscalizao do FUNDEF, do SUS etc). Quarta: a ideologia
liberal, permissiva a corrupo, e alguns socilogos e economistas
sem compreenso da tica e sem a menor empatia emocional pelos
oprimidos. Quinta: a extrema presso dos proletrios. Sexta: a
espionagem poltica da ABIN sobre os movimentos de libertao do
proletariado e pela reforma agrria. Stima: o fato de o Brasil ser um
paraso fiscal para os ricos e para o dinheiro sujo (basta ver o
desmonte da Receita e o escndalo das contas CG-5). Oitava: o
financiamento privado das campanhas eleitorais. Nona: o processo
genocida da rolagem da dvida pblica (o atual governo multiplicou a dvida
pblica interna por mais de dez e, no mnimo, fez dobrar a externa,
comprometendo, anualmente, cerca de 75% do Oramento para a rolagem
da dvida, que assim mesmo continua a crescer pelo menos 20% por ano;
tudo isso depois de doar, entregar, as estatais por alguns pratinhos de
lentilhas).
Existem ainda dezenas
de outras causas. A causa fundamental, no entanto, o abismo insondvel
entre ricos e pobres, o imenso poderio do grande capital e do latifndio.
O capital em boas mos 4c964
Sobre a concentrao
do capital e o controle do grande capital sobre o Estado, vejamos um
texto de Franklin Roosevelt, de 1932, que consta do livro Franklin
Roosevelt, de Fred C. Israel, editado pela Nova Cultural em 1987:
Vemos que dois teros das indstrias norte- americanas esto
concentrados em poucas centenas de corporaes, e na verdade dirigidos
por no mais que cinco pessoas. Vemos que mais da metade das economias
da nao est investida em depsitos e hipotecas e faz da bolsa de
valores o esporte dos norte-americanos. (....) Vemos que grande parte de
nossa populao trabalhadora no tem chance de ganhar a vida. E,
em 1936: Sabemos agora que um governo do capital organizado to
perigoso como o governo do crime organizado. Nunca como hoje estiveram
essas foras to unidas contra um candidato como esto agora. So unnimes
em seu dio por mim, e eu bendigo seu dio.
Dois teros das indstrias
nas mos de poucas centenas de corporaes, dirigidas cinco pessoas.
Nem Nero tinha esse poder. De fato, o prprio Adam Smith j sabia que,
toda vez que dois ou mais capitalistas se encontram, mesmo em jantares,
am a conspirar pelo controle do Estado para, impunemente, oprimir os
trabalhadores e os consumidores.
O governo do capital
organizado corretamente equiparado, por Franklin Roosevelt, a um
governo do crime organizado. O termo crime de colarinho branco
white collar crime foi criado por Donald Sutherland para
designar os crimes tpicos de quem frequenta o topo da pirmide
social, como delitos financeiros, corrupo ou sonegao de
impostos. Esses crimes que, num pas como o Brasil, significam bilhes
de reais levam morte milhes de pessoas pobres, atingidas por
vermes, inanio ou outros fatores.
O predomnio do capital 616r61
Em todo ato de corrupo
h o elemento ativo, o corruptor, que detm o capital e atua como Satans,
como tentador, e o elemento ivo, o corrompido, o agente pblico,
que responde por corrupo iva. E evidente que a causa da corrupo
est no elemento ativo, no corruptor, que quase sempre um
latifundirio ou um grande capitalista. A melhor soluo para
diminuir drasticamente a corrupo est em liquidar o latifndio e
o grande capital privado, quase sempre organizado em trustes ou cartis.
E o velho Barbosa Lima Sobrinho j apontava os malefcios do monoplio
ou do oligoplio privado.
O liberalismo econmico
, em si, uma teoria que gera e propicia a corrupo, pois defende a
tese de que a economia (e, assim, boa parte da sociedade) deve ser
regida pelo mercado. Ora, o mercado so os grandes capitalistas, que o
controlam. Logo, item os liberais que os grandes capitalistas devem
controlar a sociedade. Numa economia capitalista, no fundo so o
capital monopolista e o latifndio que terminam por governar e reger a
economia, sem concorrncia. Os pequenos e mdios produtores so tambm
explorados pelos cartis e trustes.
Esses grandes
capitalistas e latifundirios financiam campanhas e exercem presso
atravs de lobbies. Como lobistas, a influncia das corporaes
(capital monopolista) e do latifndio no Estado devastadora. Em boa
parte do mundo, Os mais ricos so proibidos de financiar campanhas. No
Brasil, onde as leis so permissivas, a fiscalizao pfia, e
ainda h sucessivas anistias escandalosas de delitos eleitorais. A
corrupo eleitoral, o controle da mdia e a infiltrao de
executivos que agem como uma tnia abrem as portas para outras formas
de corrupo.
As formas de controle do Estado 2o2x29
A principal forma de
influncia e controle do Estado ocorre pela manipulao da mdia -
principalmente da mdia eletrnica, que atinge diretamente o
imagin6rio e as conscincias do proletariado e da classe mdia. Desta
forma, so semeados ermo e mentiras que tentam legitimar a opresso e
a desigualdade social, alm de banir a tica da inistrao, da
poltica e da economia. Depois, vm as campanhas polticas regidas
pelo abuso do poder econmico, pela compra de votos e pelos lobbies.
Outra forma o nepotismo, so as influncias familiares que levam
colocao de filhos, irmos, netos e esposas de representantes do
poder em cargos estratgicos. E, quando nada disso funciona, h a
infiltrao e a compra de conscincias, diretamente ou corno
subproduto de alvos vigiados para a formao de dossis para
chantagem.
A corrupo , no
fundo, a falta de tica na poltica, no Estado. E uma forma de gesto
do Estado voltada para o bem privado de ricos, e no para o bem comum.
Desta forma, um governo controlado pelo grande capital ou pelos
latifundirios pode ser chamado de cleptocracia, plurocracia, etc.
Aristteles, no Livro A Poltica, j tratava, na parte sobre formas
de governo, da oligarquia, regime onde os ricos governam. Oligarquia, ou
plurocracia, ou governo neoliberal, ou governo ttere do FMI, o que
representam os bancos internacionais e os grandes capitalistas que
aplicam nesses bancos.
Os exemplos histricos 3r3828
Basta verificarmos a
histria para constatarmos grandes casos de corrupo. Marcos (nas
Filipinas) Trujillo, Batista, Prez Jimnez, Somoza, Rojas Pinilla,
Duvalier, Salinas, Pinochet (a guerra suja para garantir o controle do
Estado pelo imperialismo, pelas multinacionais), Stroessner, Ian Smith,
Watergate, Collor e PC Farias, Lockheed, Irangate, Fujimori e Montesinos,
ministros do Japo e da Itlia e corruptos na Indonsia, para
citarmos apenas alguns. Todos esses personagens defendiam o mesmo iderio.
Todos foram neoliberais na economia, defendendo o mesmo que FHC: ausncia
de impostos diretos progressivos, falta de fiscalizao tributria
efetiva, privatizaes, terceirizaes, desregulamentao, destruio
da seguridade social, manuteno do latifndio, extroverso da
economia, livre competio dentro e fora das fronteiras, diminuio
de tarifas alfandegrias, permissividade com o contrabando por causa da
falta de fiscais, eliminao de direitos sociais (trabalhistas e
previdencirios), precarizao das condies de vida dos servidores
pblicos, fim da educao gratuita, destruio da sade pblica,
liberdade de juros e de cmbio, liberdade de remessas para o exterior
etc. Enfim, o desmonte do Estado, o iderio de Collor, de FHC, da
Trilateral e do Consenso de Washington.
Tudo mercadoria 65224g
O grande capital e o
latifndio transformam tudo em mercadoria. Inclusive o trabalho e o
corpo das pessoas, pela prostituio. Com a mercantilizao de tudo,
o mercado regendo tudo, a regra do laissez faire, laissez er
transposta para o funcionamento do Estado.
No livro Os donos do
poder, de Raimundo Faoro, fica claro o controle do Estado pelos grandes
proprietrios. O militarismo ou as ditaduras militares tambm
uma forma de corrupo do poder. Em vez da promoo do bem comum
(criar condies de vida plena para todos), o Estado, controlado pelos
grandes proprietrios e no pelo povo organizado, nega os direitos polticos
do povo e gasta bilhes em armas que geram guerras coloniais, como a
que ocorreu recentemente na invaso do Afeganisto pelos EUA. E
pior ainda quando os generais vendem suas conscincias para as
multinacionais, terminando a vida como traidores, lacaios do
imperialismo. A base do militarismo esto no complexo militar-poltico
nos EUA, associando o Pentgono ao grande capital. Esse esquema, que
envolve contratos de fornecimento de armas, ligaes das
multinacionais com as embaixadas norte-americanas e com a CIA e os
banqueiros estadunidenses, mostra a quem servem os Exrcitos em boa
parte dos pases. Os militares americanos terminam como guarda
pretoriana de multinacionais, que corrompem e compram pessoas,
controlando nossa mdia e financiando campanhas.
O ento presidente
Clinton, em sua mensagem ao Congresso no ano de 1992, lamentou que,
(....) no ano ado, pela primeira vez desde 1920, 1% dos
norte-americanos tem mais riqueza que todas as possudas por 90% da
populao (...) (Minsburg: 1994, p. 17). Esse texto foi retirado de
Atlio Boron. E algo parecido ocorre no Brasil. Da mesma forma, o livro
Introduo Economia, de N. Gregory Mankiw, professor de economia na
Harvard University usado em muitas universidades americanas e europias,
ao tratar da desigualdade de renda ao redor do mundo, diz que no
fim da lista est o Brasil, onde um quinto dos mais ricos aufere uma
renda cerca de 30 vezes maior do que o quinto mais pobre. Na verdade,
somos mesmo campees de desigualdade social, de acidentes do trabalho,
de devastao ambiental e de submisso ao imperialismo. Por isso,
somos campees de corrupo.
Riquezas concentradas 565y2x
No mundo, existem cerca
de 40 mil multinacionais, oligoplios poderssimos. Elas respondem por
mais da metade do comrcio mundial de manufaturas e por trs quartas
partes da proviso de servios. Atlio Boron tambm acrescenta que a
tera parte do comrcio internacional consiste simplesmente em transaes
intrafirma, e as cifras de vendas dessas empresas equivalem
aproximadamente a tera parte do produto bruto do planeta. Dessas 40
mil multinacionais, cerca de 300 grandes monoplios exercem um poder
de mercado na economia norte-americana. E cerca de 150 fazem o
mesmo no Reino Unido (Leyes: 1996, p.5). Cinquenta das maiores
transnacionais possuem rendas anuais superiores ao produto bruto das
duas teras partes dos pases de todo o mundo (Leys e Panitch: 1998,
p. 18). Um dos gigantes do capital especulativo mundial, Goldman &
Sachs, tem lucros anuais da ordem de 2,6 bilhes de dlares, que
distribui entre seus 161 scios principais uma cifra
aproximadamente igual ao PIB da Tanznia, que distribuda entre
seus 25 milhes de habitantes.
Atlio Boron mostra,
ainda, que 358 supermilionrios dispem de rendas equivalentes
renda total dos 2,3 bilhes de pessoas mais pobres do planeta.
Diante desse quadro, os liberais no Brasil buscam liquidar o Estado,
liquidar nossa moeda com projetos de dolarizao e ainda nos inserir
numa Alca feita para ampliar nossa situao de colnia. O resultado?
O florescimento da corrupo, da lavagem de dinheiro, da devastao
ambiental e da explorao dos trabalhadores.
Os remdios 5c4i5a
Finalizando, vejamos
alguns remdios para esse quadro. Primeiro: reformas estruturais,
anti-latifundirias, anti-imperialistas. Uma reforma agrria que
varresse o latifndio, estabelecendo um limite ao que cada um pode ter
de terras, democratizaria o Estado e o libertaria desse tipo ttrico de
tnia, o latifndio. A reforma agrria esta conectada questo das
cidades e estrutura e ao tamanho dela. Por isso, somente poder ser
feita combinada com a reforma urbana, com o combate implacvel
especulao fundiria e estocagem de terras. Segundo: auditoria da
dvida pblica (e, como resultado, o no pagamento, pois a dvida
j foi paga, sendo que boa parte so juros, e o dinheiro beneficiou
multinacionais e o grande capital privado). Terceiro: reforma no direito
de propriedade e na estrutura das empresas, para permitir vasto
planejamento pblico, co-gesto e autogesto pelos trabalhadores.
Quarto: ampliao dos direitos trabalhistas e dos servidores pblicos,
com aumento do salrio mnimo e reduo da jornada para 32 horas ou
algo assim, sem horas extras. Quinto: total transparncia do Estado
TCU aberto, com poder para os auditores de lavrar multas, sendo que os
ministros do TCU teriam que ser concursados, para que somente auditores
com vinte anos de prtica chegassem ao canso de ministro, atuando como
instncia recursal, e no mais concentradora (as medidas envolveriam,
ainda, a abertura do SIAFI na internet e o fim das polcias polticas,
responsveis pela espionagem poltica). Sexto: fim do inqurito
policial, sendo que a investigao preliminar ocorreria como ocorre na
Itlia, nos EUA ou na Alemanha, com ampla participao e superviso
do MPF, ficando a polcia livre da ingerncia poltica dos palcios.
Stimo: reforma do Judicirio, nos moldes pregados pela Associao
dos Juizes para a Democracia, por Hlio Bicudo, por Fbio Konder Comparato,
etc. Oitavo: reforma tributria, para que o sistema deixe de ser
regressivo (fim do primado dos impostos indiretos) e seja intensamente
distributivista, liquidando as grandes fortunas para garantir o imposto
de renda negativo, garantindo um colcho social para os trabalhadores
e a igualdade social. Nono: mais fiscais com mais poderes. Dcimo:
transparncia para a fiscalizao da CVM, do BACEN, da Secretaria
Federal de Controle, do COAF, da ANVISA, da fiscalizao ambiental.
Enfim, so receitas
antigas e boas. Seria fcil citar mais umas cinquenta delas. Todas
dependem da ampliao da conscincia e da organizao dos
trabalhadores. A se encontra a raiz de todos os remdios para a
corrupo, com a garantia de um Estado controlado pelos trabalhadores,
voltado para a promoo do bem comum, da comunho.
|